Vivemos em uma era em que a busca pelo propósito se tornou quase uma obsessão. Em um mundo de incertezas, muitos se apegam à ideia de uma estrela do norte, como dizem os americanos, um único propósito fixo que deveria guiar todas as nossas decisões. No entanto, essa visão linear e rígida pode ser mais limitadora do que libertadora.
Tive a oportunidade de explorar profundamente essa questão com meu mentor Michael Ventura, autor e estrategista, que propõe uma abordagem diferente: em vez de uma única estrela do norte, nosso propósito é mais parecido com uma constelação, um conjunto de referências que nos ajudam a navegar pelas mudanças da vida. Esse conceito ressoa profundamente comigo e tem influenciado minha forma de pensar sobre desenvolvimento pessoal e profissional.
A ideia de um único propósito tem raízes em um passado onde carreiras e vidas eram mais previsíveis. Era comum passar décadas em um único emprego, construir uma família dentro de padrões bem estabelecidos e seguir um roteiro de vida relativamente estável. Mas o mundo mudou. Hoje, mudamos de emprego com frequência, nossos interesses evoluem e eventos inesperados como uma pandemia global reconfiguram completamente nossas prioridades. O que parecia ser um propósito sólido há cinco anos pode já não fazer sentido hoje. Ventura argumenta que nos apegamos à ideia de uma única estrela do norte porque fomos condicionados a acreditar que existe uma resposta definitiva para a pergunta “qual é o meu propósito?”, no entanto, essa busca muitas vezes leva à frustração, pois raramente encontramos um único caminho que satisfaça todas as dimensões da nossa identidade.
A alternativa a essa visão linear é pensar no propósito como uma constelação. Em vez de buscar um único ponto fixo no horizonte, podemos mapear diferentes aspectos da nossa vida que, juntos, formam um guia mais completo e adaptável. Michael Ventura propõe que, para construir nossa própria constelação, devemos considerar treze elementos que influenciam nosso senso de propósito. Entre eles estão a origem e como nossas experiências iniciais moldaram quem somos, a identidade e os valores essenciais que nos definem, os relacionamentos e quem nos apoia ou quem nós apoiamos, a expressão e a forma como compartilhamos nossas ideias e talentos com o mundo, o bem-estar e o cuidado com nossa saúde física e mental, e o legado que queremos deixar. Ao olharmos para essas dimensões, percebemos que propósito não é um destino fixo, mas um equilíbrio dinâmico entre diferentes áreas da vida. E, assim como uma constelação, nossa trajetória pode ser ajustada conforme crescemos e evoluímos.
Para aplicar essa abordagem no dia a dia, Ventura sugere algumas perguntas que podem ajudar a esclarecer nossas direções. Quem são seus heróis e por quê? As qualidades que admiramos nos outros muitas vezes refletem o que buscamos em nós mesmos. Quais são suas aspirações atuais? Não o que você queria há dez anos, mas o que realmente importa para você agora. O que te preenche e o que te esgota? Avaliar se há equilíbrio entre o que você dá e o que recebe nas suas relações. Quais são os sinais de que você precisa mudar? Muitas vezes ignoramos sinais de desconforto e estagnação. Como uma lagosta que precisa abandonar sua casca para crescer, precisamos nos permitir momentos de vulnerabilidade para expandir nosso potencial.
Uma das reflexões mais impactantes que aprendi com Ventura é a noção do “dead date”, um exercício de imaginar sua expectativa de vida e calcular quantas oportunidades ainda restam para fazer as coisas que realmente importam. Quantas vezes mais você verá seus pais? Quantos livros ainda lerá? Quantas viagens ainda fará? Esse tipo de pensamento nos ajuda a entender que o tempo é um recurso finito e que devemos usá-lo com intenção. Se não há uma única estrela do norte para guiar nossa vida, cabe a nós escolher conscientemente quais pontos da constelação queremos seguir em cada fase da jornada.
O conceito de propósito muitas vezes nos leva a uma busca exaustiva por respostas definitivas. Mas talvez a resposta não esteja em uma única direção, e sim na construção de um caminho que faça sentido a partir daquilo que valorizamos. Em um mundo em constante transformação, nossa melhor bússola pode ser a capacidade de adaptação, combinada com uma visão clara dos elementos que compõem a nossa constelação pessoal.