A frase de Otto von Bismarck, chanceler do Império Alemão no século XIX, ainda ecoa com força no cenário atual. Ao comparar leis e salsichas, Bismarck expunha o que muitos evitam admitir: a feitura de ambas pode ser tão indigesta quanto o resultado final parece apetitoso. Por trás de um embutido bem temperado, há uma mistura de ingredientes questionáveis. Por trás de uma lei bem intencionada, muitas vezes há interesses mal explicados, atalhos processuais e uma ausência desconcertante de escuta à sociedade civil.
Em teoria, a função da lei é nobre: organizar a vida em sociedade, garantir direitos, mediar conflitos e assegurar a justiça. Mas, na prática, o caminho que uma proposta legislativa percorre até virar norma muitas vezes ignora as consequências concretas de sua aplicação. O debate técnico é substituído por pressões políticas. A análise de impacto é negligenciada. E a consulta a especialistas e cidadãos diretamente afetados fica em segundo plano.
O resultado são leis que, apesar de válidas no papel, fracassam na realidade. Criam insegurança jurídica, penalizam quem não deveria ser penalizado e favorecem quem já opera à margem das brechas. Algumas normas sufocam inovações, engessam setores produtivos ou geram custos sociais enormes — tudo isso em nome de boas intenções mal executadas.
Precisamos de um novo pacto com o processo legislativo: mais transparência, mais técnica, mais diálogo. A elaboração de leis não pode ser um processo opaco, restrito a gabinetes e alianças de ocasião. Assim como exigimos rótulos claros nos alimentos, também devemos exigir que as leis tragam consigo um compromisso com o bem público, com a ética e com o senso de responsabilidade sobre seus efeitos práticos.
Porque, ao contrário do que dizia Bismarck, talvez já seja hora de sabermos exatamente como são feitas as salsichas — e, principalmente, as leis.