Enquanto a campanha municipal em São Paulo dá aos eleitores reiteradas provas do quanto a cidade ficou em segundo plano, somas de circunstâncias que precisavam ser observadas com mais atenção foram deixadas ainda mais de lado.
O que está ao alcance de cada um de nós fazer para que o circo fique de lado? Quão utópico é pensar que o interesse público é o que realmente deveria balizar o debate? Quão impossível é esse caminho em meio aos desatinos de todos os dias… Nossas cidades estão em colapso. Vai faltar água em São Paulo e o governo só espera a eleição para anunciar medidas duras.
A cadeirada do candidato do PSDB, José Luiz Datena, os memes, a qualidade pífia do debate da Redetv!/UOL nessa manhã, tudo muito desalentador, com o perdão pelo eufemismo porque chamar de excrescência não seria nenhum exagero… A quem Pablo Marçal (PRTB) serve? Por que ele nos leva a um limbo tão assustador? Será que ninguém percebeu que esse tom – uma campanha abjeta – afasta demais o eleitor comum da política?
No fim de semana, ouvi de uma renomada infectologista que tem mais de 70 anos que, pela primeira vez, vai exercer o direito de não votar, benefício facultado pela lei em função da idade. Quantas pessoas agirão dessa forma, tendo a idade como escudo para que a cidadania eleitoral e o futuro da cidade fiquem ao léu.
A capital federal é o combo perfeito do que poderia estar no radar de quem pensa, minimamente, no interesse público. Cheguei em Brasília no domingo (15) para um importante evento de Educação a Distância, que ocorre até o dia 18. Floresta Nacional em chamas, mais de 140 dias sem chuva, umidade relativa do ar baixa, poeira, temperaturas elevadas – um, insisto, “combo perfeito” para deixar ainda pior ou mais vulnerável quem enfrenta doenças respiratórias ou quadros gripais, sinusite e afins. Previsão de chuva? Para a segunda quinzena de outubro… Aulas suspensas e imagens, nas redes sociais, que parecem de filmes catastrofistas de ficção. A cidade alaranjada, o colapso e o fogo por todo o lado…
O DFTV, da Globo, canaliza 80% da sua cobertura para o incêndio na Floresta Nacional, que está sendo consumida pelas chamas há dias. Matérias sobre a qualidade do ar, o ar seco e o “desconforto respiratório” também surgem, sem força para trazer os ventos, a chuva, a consciência…a transformação.
Criou-se a ideia de que meio ambiente, preservação de áreas verdes, de florestas, de espécies nativas, uso responsável da água, tudo isso é, segundo a ignorância polarizada, bandeira da esquerda. O agro faz o que bem entende e fica por isso mesmo. E a ministra do meio ambiente Marina Silva tem a velocidade de uma tartaruga.
O ar que respiramos (e que mata) é a prova de mais um efeito da polarização visceral, como se o mundo todo tivesse resolvido dar as costas para o que é essencial em nome do supérfluo. Qualquer hora dessas, a mãe natureza manda uma chuva e tudo volta ao normal…Não é bem assim. Como sugeriu Érico Veríssimo, os vivos estão (e serão) cada vez mais governados pelos mortos.
Wagner Belmonte é jornalista e professor universitário