O Brasil é estado soberano? O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, tem dito insistentemente que sim. Talvez pretenda afastar qualquer dúvida a esse respeito, depois que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, com o seu estilo agressivo e intempestivo, passou à adoção de medidas tarifárias desafiadoras do resto do mundo e, especialmente do Brasil.
Soberano ou soberania tem o significado de poder público do Estado, como afirmação de personalidade independente, de autoridade plena e de governo próprio, dentro do território nacional e na relação com outros Estados (Dicionário Houaiss). O Dicionário de Política de Norberto Bobbio nos traz definição mais concisa, mas bastante clara: soberania, em sentido lato, é o poder de mando de última instância, numa sociedade política organizada. Tarifário, por sua vez, diz respeito à tabela de preços de serviços alfandegários. Todo país soberano tem o direito de determinar a tabela de preços para a importação de produtos, obviamente de fora.
Donald Trump, investido de poderes quase absolutos que aprecia exercitar, tem aumentado os preços dos serviços alfandegários norte-americanos, com o nítido propósito de criar problemas para importadores de produtos de diversos países, sobretudo brasileiros. Trata-se, em fria análise, de exercício da soberania de que goza os Estados Unidos dentro do seu território, com objetivos que imaginamos, mas desconhecemos, ampliando discricionariamente os preços dos serviços alfandegários, que tornam difícil, ou quase impossível a importação de produtos brasileiros, mexicanos, da União Europeia, do Canadá, da Espanha, França, Suíça, Itália.
É necessário lembrar que tarifas alfandegárias não costumam ser aleatórias. Integram um sistema racional e equilibrado, cujos diversos componentes se ligam pela repercussão de uns sobre outros. Donald Trump, subitamente, resolveu ignorar o sistema e os acordos, formais ou apenas derivados dos usos e costumes. No exercício da soberania dos EUA, tumultuou as relações até então respeitadas, para ditar regras que lhe pareceram convenientes ao seu país.
Por outro lado, é preciso entender que neste momento o Brasil enfrenta difícil problema de política externa, no qual se encontra envolvida questão de soberania. Impossível recusar a Donald Trump, como chefe do Poder Executivo dos Estados Unidos, a prerrogativa de fixar tarifas alfandegarias reguladoras da importação de vários países. Da mesma forma, não há como negar ao presidente Lula o direito de defender os interesses brasileiros. Mera retaliação deve estar fora de cogitação. Não temos poder de fogo para brigar com os Estados Unidos.
Erram, porém, os dois, ao ultrapassarem os limites de questões tarifárias para envolverem, em inútil polêmica, processos a que responde o ex-presidente Jair Bolsonaro perante o Supremo Tribunal Federal.
O presidente Lula deve ter sido advertido pelos auxiliares próximos que a soberania Brasil se apoia sobre frágeis fundamentos. Não integramos o seleto grupo da elite econômica, como EUA e China, tampouco das potências militares. As nossas Forças Armadas destinam-se à defesa interna, à garantia dos poderes constitucionais, da lei e da ordem.
A negociação é o caminho áspero a ser trilhado com paciência, competência e habilidade. Deveria ter sido entregue, desde os primeiros momentos, aos especialistas do Ministério das Relações Exteriores, despidos de interesses eleitorais.
Os empresários brasileiros, mas sobretudo os paulistas, estão apreensivos. De um momento para outro foram colhidos de surpresa. Encontrar novos mercados não será tarefa simples. A melhor, senão a única medida possível, dependerá do resultado de difíceis entendimentos com o governo americano.
Negociar não afeta a nossa soberania. Talvez venha a ferir susceptibilidades. Não há, contudo, outro remédio. Nesse sentido a voz de todos os especialistas que tenho lido ou ouvido.