Moro num condomínio onde os prédios são tão próximos uns dos outros que a gente vê quem chega e quem sai e ouve choro de nenén, latido de cachorro, miado de gato e até o som da TV dos outros apartamentos. Uma vantagem para quem mora sozinho, que pelo menos se sente vivo, ou uma desvantagem quando se observa e se ouve quase tudo o que acontece em torno.
Fica difícil escapar de comentários como já vai gastar dinheiro, acordou cedo hoje, onde vai tão bem vestido, que belo dia, etc. Algumas vezes dá vontade de mandar para “aquele lugar”.
Em todos os casos respondo com educação aos que me cumprimentam. Não vale a pena irritar-se nem quando perguntam qual o meu signo ou se dormi bem. Quem ouve os passarinhos às quatro da matina fica feliz o dia inteiro.
Mesmo assim, há os que reclamam porque não conseguiu dormir, não conseguiu comer, que o filho chegou bêbado – por aí afora.
Um dos vizinhos é sempre generoso comigo. Segura-me pelo braço e exagera em elogios, mesmo que o interlocutor não seja amigo ou conhecido e não esteja interessado no assunto. Na verdade, esse é o jeitão dele. Alguns preferem afastar-se discretamente, evitando eventuais discussões.
Lembrei de estudo do filósofo Leandro Karnal que atribui tal comportamento àquele que não espera ser chamado para opinar, também conhecido como mala sem alça.
A proximidade dos prédios nos protege do sol, do frio e do vento, mas não da língua da vizinhança.
Vizinhança. Por Flávio Tiné
Jornalista
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