Vivemos tempos em que a tecnologia avança rapidamente, mas, infelizmente, muitas vezes ela é utilizada não para facilitar a vida dos cidadãos, e sim para lesar, confundir e gerar prejuízos. Nas últimas semanas, dois temas têm me chamado bastante a atenção no exercício da advocacia: os descontos indevidos que atingem milhões de aposentados e pensionistas do INSS e, também, a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) de iniciar o envio de intimações judiciais por WhatsApp.
Começo abordando um verdadeiro escândalo que atinge diretamente a população idosa, uma das mais vulneráveis do nosso país. Até o momento, mais de 3 milhões de aposentados e pensionistas alegam ter sofrido descontos não autorizados em seus benefícios, realizados por entidades e associações, sem qualquer consentimento formal.
É inadmissível que, em pleno século XXI, estejam tentando validar como “prova de autorização” uma simples fotografia dos segurados. Isso mesmo: uma foto! Muitas vezes, essas imagens são retiradas de redes sociais, cadastros antigos ou bancos de dados. É um absurdo jurídico imaginar que uma foto possa servir como instrumento legal para autorizar descontos em folha de benefício. Nenhum ordenamento jurídico sério pode aceitar isso.
Pior do que isso, é observar que, de forma surpreendente, o próprio Governo tenta desestimular que os aposentados busquem a Justiça, sob o pretexto de evitar a judicialização. Ora, se há lesão, há direito. E, se há direito, o caminho natural e constitucional é o acesso ao Poder Judiciário. Tentar impedir ou dificultar isso é, sim, uma afronta direta ao artigo 5º da Constituição Federal, que garante a todos o direito à ampla defesa e ao devido processo legal.
Minha orientação como advogado é clara e direta: não espere por uma solução administrativa que, infelizmente, tem se mostrado lenta e ineficaz. O caminho é ingressar imediatamente com uma ação judicial, buscando tanto o ressarcimento dos valores descontados indevidamente quanto uma indenização por danos morais, diante do evidente constrangimento e da angústia gerados por essa situação.
Por outro lado, acompanho com atenção um movimento que, à primeira vista, poderia parecer um avanço, mas que carrega riscos ocultos. Falo da decisão do TJSP de iniciar, em fase de testes, o envio de intimações judiciais via WhatsApp.
Não há como negar: a proposta tem um apelo interessante. Facilita a comunicação, traz rapidez e reduz custos. Contudo, a mesma ferramenta que aproxima também abre brechas para fraudes, golpes e insegurança. Diariamente, assistimos pessoas caindo em golpes aplicados por WhatsApp, tendo prejuízos financeiros, vazamento de dados e até falsas comunicações em nome de órgãos oficiais.
É exatamente por isso que levanto um alerta: se nem mesmo instituições financeiras, que investem bilhões em segurança digital, conseguem impedir fraudes com 100% de eficácia, como acreditar que o sistema judiciário, utilizando o WhatsApp, estará blindado contra ataques, invasões e falsificações? Se hackers conseguem invadir bancos, clonam chips, quebram senhas e burlam sistemas altamente sofisticados, o risco é real e iminente quando falamos de comunicações judiciais por um aplicativo popular e vulnerável.
O próprio Tribunal afirma que utilizará números oficiais cadastrados, que isso será feito apenas em atos de intimação e que não substituirá os meios tradicionais. No entanto, sabemos que o criminoso digital está sempre um passo à frente, buscando brechas e explorando fragilidades, especialmente quando a vítima é um cidadão comum, muitas vezes leigo e vulnerável.
Diante desse cenário, o que defendo é equilíbrio, cautela e, principalmente, responsabilidade. É possível, sim, adotar ferramentas tecnológicas, desde que haja garantias robustas de segurança, proteção de dados e mecanismos eficientes de autenticação, capazes de mitigar o risco de fraudes e golpes.
Por fim, tanto no caso dos aposentados vítimas de descontos indevidos quanto na implementação de intimações via WhatsApp, é fundamental que o cidadão esteja informado, atento e, se necessário, amparado por profissionais capacitados. A Justiça é um direito de todos, e nenhuma inovação, seja ela digital ou administrativa, pode suprimir, relativizar ou fragilizar esse princípio.