O Brasil tem assistido a um aumento alarmante da degradação ambiental, impulsionada por atividades ilegais como as queimadas, o desmatamento e a destruição provocada por garimpos em terras indígenas, gerando consequências devastadoras não apenas para o meio ambiente, mas também para as comunidades que dependem dos recursos naturais para sua subsistência. O total de multas aplicadas pelo Ibama e o ICMBio chega a R$ 29,1 bilhões, o que abre espaço para uma oportunidade transformadora: converter essas penalidades em um fundo, com dois eixos principais: recuperação ambiental, com parte dos recursos destinada a projetos de reflorestamento, recuperação de nascentes e restauração de ecossistemas e inclusão produtiva, com foco em acolher as comunidades vulneráveis, oferecendo capacitação em diversas áreas, tais como agricultura sustentável, ecoturismo e atividades essenciais relacionadas a cada ecossistema, acrescida da conexão com oportunidades de renda, gerando empregos e estimulando o empreendedorismo local.
Entendo que esse fundo teria critérios claros para a seleção dos projetos que seriam financiados, garantindo a transparência e a eficiência na aplicação dos recursos. Um exemplo possível de estrutura seria o Blended Finance, que combina recursos públicos e privados e, eventualmente, capital de fomento, para maximizar o impacto social e econômico. Neste cenário, as multas ambientais não pagas formariam a “primeira camada” de capital, assumindo parte do risco e atraindo investimentos privados. Os recursos combinados permitiriam ampliar a capacidade de execução dos projetos de inclusão produtiva, garantindo um impacto duradouro.
A ideia representa benefícios para as comunidades e o país. Para o primeiro, promoveria a oportunidade de reconstruir suas economias de forma sustentável, aproveitando as riquezas naturais sem destruí-las. Já para o segundo, poderia servir como um modelo inovador de justiça ambiental, transformando penalidades financeiras em ações concretas de reparação ambiental, social e desenvolvimento econômico.
A efetividade no uso dos recursos oriundos das multas aumentaria a credibilidade das instituições ambientais brasileiras, demonstrando que as penalidades impostas não são meramente punitivas, mas também geradoras de soluções práticas para os problemas sociais causados pelos crimes ambientais.
Pela perspectiva das empresas condenadas, seria a oportunidade de converter as punições recebidas em ações positivas, podendo, inclusive, reportar essas ações em seus relatórios de responsabilidade social e ambiental (ESG).
E já existe embasamento legal para isso. O Ibama, por meio de instruções normativas e do Decreto Federal nº 6.514/2008, já regulamenta como a conversão de multas ambientais deve ocorrer na prática. Ou seja, a conversão de multas não é uma novidade ou inovação, mas sim um mecanismo já existente e em vigor no Brasil.
Portanto, a proposta de canalizar as multas para a inclusão produtiva em comunidades afetadas não demanda a criação de novos instrumentos legais, mas sim a ampliação da utilização de mecanismos já existentes com foco em projetos que integrem o desenvolvimento econômico sustentável com a reparação ambiental.
É uma iniciativa de grande potencial. É possível desenvolver políticas públicas que ampliem o uso desses recursos de forma mais estratégica. Por exemplo, empresas que atuam sob concessão federal — como no setor de energia, infraestrutura e mineração — poderiam ser incentivadas a participar mais ativamente em projetos de conversão de multas ambientais, especialmente aqueles voltados à inclusão produtiva e à mitigação dos danos nas comunidades afetadas. Um caminho seria a criação de critérios de pontuação diferenciada em editais públicos, incluindo PPPs e Concessões, onde empresas que demonstrem participação efetiva em programas de conversão de multas ou que apresentem um histórico de responsabilidade social e ambiental possam obter vantagens competitivas.
O Brasil está diante da oportunidade de liderar esse movimento e se tornar referência em tecnologias sociais para o mundo, convertendo penalidades em oportunidades reais para aqueles que mais precisam. Ao aproveitar os recursos existentes, podemos criar soluções que não apenas mitiguem os danos causados ao meio ambiente, mas também ofereçam um futuro mais promissor para as comunidades que dependem da preservação de nossos recursos naturais.