O mundo pode respirar aliviado, pois, por ora, não haverá “banho de sangue” no Norte da América do Sul: o ditador Nicolás Maduro está reeleito para mais seis anos de poder, de acordo com o Conselho Nacional Eleitoral, controlado pelo próprio Maduro.
Simón Bolívar, o Libertador, patrono da democracia na América Latina, deve estar se agitando em sua tumba, no mausoléu de Caracas. A Venezuela, com amplo território e uma das maiores reservas de petróleo do mundo, poderia ser um país estável e feliz, mas, ao contrário, é um triste exemplo de predomínio do populismo autoritário, corrupto e incompetente. Os direitos humanos estão sepultados ao lado de Bolívar, enquanto Maduro, de uniforme esportivo com as cores da Venezuela, não se envergonha de demonstrar que a democracia no país não passa de uma fantasia.
Infelizmente, a América Latina tem vocação para longas ditaduras de direita e de esquerda, como as de Pinochet, Fidel, Getúlio, Perón, Trujillo, Banzer, Stroessner e Somoza. A Venezuela, que no passado padeceu sob ditaduras de direita, sofre hoje os impactos de uma ditadura de esquerda, nascida sob a liderança de Hugo Chávez e mantida sob o sucessor Maduro. Já são 25 anos seguidos de uma gestão desastrosa, que levou grande parte da população venezuelana a migrar para os países vizinhos, para os Estados Unidos e para a Europa. Se Maduro completar este novo mandato conquistado às custas de fraudes, o predomínio chavista passará de 30 anos.
As reações no mundo variam de acordo com as cores da ideologia dos governantes. Dentro dessa lógica, é normal que Vladimir Putin, num intervalo das reuniões de planejamento de novos ataques armados da Rússia contra a Ucrânia, tenha logo enviado parabéns a Maduro, reconhecendo como legítimo o resultado das “eleições” de 28 de julho. Outro apressado em dar apoio a Maduro foi o corrupto ditador de esquerda Ortega, da Nicarágua. O regime de Cuba, que segue a filosofia continuísta de Fidel Castro, não ficou atrás: “¡Siempre hermanos!”
Por parte da atual diplomacia brasileira sob o governo Lula, não causa surpresa o silêncio. Logo que tomou posse para seu terceiro mandato, em 2023, Lula estendeu tapete vermelho no Palácio do Planalto para receber Maduro e proclamar que a Venezuela é uma democracia. Recentemente, demorou quatro dias para Lula condenar a ameaça de Maduro de que, caso a oposição viesse a ganhar as eleições, haveria um “banho de sangue” na Venezuela.
Vitória da ditadura, sinal verde para novas ações de autoritarismo e demagogia, como o plano de invadir o território de Essequibo, da Guiana, anunciado por Maduro no ano passado, alegando que a área pertence à Venezuela. A quem interessa o ambiente de tensão no Norte da América do Sul?
Visitei a Venezuela cinco vezes. A primeira, como turista, em 1968. As demais, a trabalho. A última ocorreu em outubro de 2012: cheguei a Caracas uma semana depois de Hugo Chávez ter sido reeleito sob o signo da farsa. Os jornais estavam sob censura. Os canais de TV, sob intervenção, haviam despejado intensa campanha de Chávez contra a oposição. Uma vez vencedor, o ditador continuou diariamente nas telas, com promessas mirabolantes, enquanto o povo padecia com a falta de alimentos nos supermercados. Com câncer, ele morreu em março de 2013, apontando Maduro como seu sucessor. A nova eleição oficial confirmou a indicação: Maduro venceu por pequena margem de votos, mas venceu. E continua vencendo.
Quem perde?
Que tal perguntar aos milhões de venezuelanos que abandonaram o país?