O surgimento das redes sociais criou um novo tipo de
comportamento na sociedade. Como diria Norberto Bobbio, é a
chance para uma legião de idiotas se manifestar e vomitar todos
os seus traumas e preconceitos sem o mínimo compromisso com
a responsabilidade. Daí a necessidade, mais do que urgente, de
haver uma regulamentação para esse verdadeiro ataque
cibernético que semeia ódio e atrai o que é de pior do ser
humano. Países europeus já se movimentam para dar um basta a
esse modo de promoção da barbárie. O presidente Lula, em
discurso de abertura da Assembleia Anual da ONU, chamou a
atenção para essa necessidade, obtendo o apoio inclusive de Bill
Gates.
O resultado da incivilidade digital mostra toda as suas garras na
atual campanha eleitoral para a prefeitura de São Paulo. Ao
entrar na corrida sem tempo algum de rádio e TV, o candidato
Pablo Marçal lançou mão daquilo que lhe rendeu dinheiro na
vida profissional: enganar otários.
Mas, não poderia fazer isso sem usar estrategicamente o
sentimento que vigora em boa parte da população: se
apresentar como um combatente do sistema que está aí. E a qual
sistema ele se refere exatamente? A uma indignação difusa de
que tudo que vem da política está manchado de sujeira. A isso
ele agrega uma verborragia ilimitada de insultos e agressões
contra tudo e contra todos. Não é à toa que boa parte do
eleitorado que admira Jair Bolsonaro vê em Marçal o “Mito 2.0”,
um robocop avançado da mediocridade.
A cadeirada de José Luiz Datena em Pablo Marçal foi
consequência natural de uma trama pensada, assim como o soco
de um assessor do “M” no marqueteiro de Ricardo Nunes. A
ideia é essa mesma: aproveita-se o sentimento de indignação
contra o sistema político – validado pelos próprios eleitores,
registre-se – para expor de forma grosseira e torpe uma suposta
alternativa para “arrumar a casa”.
Ora, uma eleição exige dois bons ingredientes: candidato e
programa. Se haverá cumprimento ou não das promessas do
vencedor, é outra história que, aliás, contribui para aumentar a
desconfiança na política. Porém, o que Pablo Marçal apresenta é
apenas um amontoado de frases construídas para saciar o
apetite do mais baixo senso comum.
Diante disso, os demais candidatos demoraram a perceber como
enfrentar a voz dissonante da disputa. E que ninguém se engane.
O objetivo era “chacraniano”, ou seja, “eu não vim para explicar,
eu vim para confundir”.
Ao fazer isso e deixar os demais candidatos atônitos, Marçal
surfou na onda do sucesso, aproveitando, inclusive, para vender
mais de seus produtos. O problema é que não ficou somente
nisso. Ao baixar o nível do debate de forma intencional, acabou
levando a eleição para o ringue e até mesmo para a esfera
criminal produzindo a sensação de que “todos os candidatos são
iguais”.
Agora, na eleição, caberá ao cidadão saber distinguir entre a
farsa e a verdade. De qualquer maneira, o estrago está feito.
Marco Piva é jornalista, apresentador do programa Brasil
Latino (Rádio USP) e editor-chefe do canal de Youtube China
Global News (@chinaglobalnews).