A política de segurança pública é, na realidade, uma forma concreta de assegurar
aos cidadãos seus direitos humanos fundamentais. Ao longo de milhares de anos,
a humanidade desenvolveu-se com o objetivo primordial de garantir a própria
segurança física, formando aglomerados habitacionais que oferecessem proteção
contra a predação de animais e a violência de seus semelhantes. Foi em torno
dessa busca por segurança que a sociedade ergueu os alicerces de suas
estruturas sociais e religiosas.
Esse impulso primitivo por proteção evoluiu, com o tempo, para formas mais
complexas de organização social, culminando na formação do Estado moderno,
cuja função precípua, conforme delineado por teóricos como Thomas Hobbes e
John Locke, é garantir a segurança dos indivíduos mediante o monopólio legítimo
da força. Nesse sentido, a segurança pública transcende a mera contenção da
violência, assumindo-se como um elemento estruturante do pacto social que
legitima a autoridade do Estado perante seus cidadãos.
À luz do Direito Constitucional brasileiro, a segurança pública é compreendida
como um dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, conforme dispõe o
art. 144 da Constituição Federal de 1988. Trata-se, portanto, de um direito
fundamental instrumental, na medida em que garante o exercício de outros
direitos como a liberdade, a propriedade, a vida e a integridade física.
No plano penal, a segurança pública se materializa por meio de um sistema de
normas e instituições cujo objetivo é proteger os bens jurídicos mais relevantes,
promovendo a contenção de condutas socialmente lesivas. Outrossim, deve ser
pensada como um conjunto de ações integradas, preventivas e repressivas de
intensidade tal que visem assegurar a paz social para uma determinada
sociedade, conforme a capacidade cognitiva dos seus cidadãos.
A inoperância do Estado ou sua omissão deliberada na repressão eficaz aos
crimes contra a pessoa configura violação direta aos direitos humanos e aos
preceitos constitucionais fundamentais. Tal omissão, quando sustentada por
legislações excessivamente permissivas ou por interpretações jurisprudenciais de
viés excessivamente liberal, enfraquece a função preventiva e repressiva do
Direito Penal, comprometendo a proteção de bens jurídicos essenciais, como a
vida, a integridade física e a dignidade humana.
No contexto de um Estado Democrático de Direito, a omissão na tutela penal dos
direitos fundamentais não apenas representa uma falha administrativa ou
legislativa, mas traduz um déficit de legitimidade constitucional, ao permitir que a
ordem jurídica se torne inócua frente à escalada da criminalidade violenta. Essa
lacuna na atuação estatal contribui para o sentimento generalizado de
impunidade, alimenta a desconfiança nas instituições e abre espaço para o
fortalecimento de organizações criminosas, que passam a exercer, muitas vezes,
um controle territorial e social à margem da legalidade.
A Constituição Federal de 1988 impõe ao Estado o dever de garantir a segurança
pública e proteger os direitos da pessoa humana. A negligência nesse dever – seja
por ação ineficaz, seja por omissão implica violação ao princípio da proteção
deficiente (Untermassverbot, segundo a doutrina alemã), pelo qual o Estado, ao
não adotar as medidas mínimas exigíveis para salvaguardar os direitos
fundamentais, incorre em responsabilidade jurídica e política.
Portanto, legislações que relativizem de forma desproporcional a repressão a
crimes dolosos contra a vida, ou as políticas de segurança baseadas em discursos
meramente garantistas de vieses ideológicos, desvinculados da realidade
criminológica do país, não se coadunam com a função essencial do Direito Penal
em uma sociedade democrática, que se constituí na proteção eficaz dos bens
jurídicos fundamentais. A ausência dessa proteção representa, em última análise,
uma negação concreta dos direitos humanos que o Estado se comprometeu
constitucional e internacionalmente a promover.
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