Introdução. No relacionamento entre as pessoas físicas ou jurídicas pode ocorrer que alguém precise de algum recurso e não o tem. Busca-o, então, com terceiros um empréstimo para satisfazer necessidade imediata. Através do empréstimo surge a dívida. Outra coisa não significa que a assunção de um compromisso financeiro assumido por empréstimo no âmbito interno ou externo.
Outra vertente entende que todo e qualquer encargo que recaia sobre um ente se constitua em dívida. Questão de posicionamento.
Todos nós, em certo momento da vida, assumimos uma obrigação financeira para efetuarmos o pagamento na data aprazada. Seja na compra de um veículo, de uma casa, para garantia do estudo de filhos. Se a renda mensal não garante a assunção do compromisso buscado, valemo-nos de um banco ou de uma financeira para suportar os encargos.
De igual maneira os países assumem dívida para suportar seus encargos financeiros ou sociais.
Montante da dívida. A dívida federal é de 6.64 trilhões de reais para março de 2024. Em relação ao PIB atingiu 75,6%. Os detentores da dívida são instituições financeiras e o grupo da Previdência. A dívida externa é de 335,6 bilhões de dólares
Começo da dívida. A dívida brasileira começa com a independência. Para que fosse reconhecida pelos países estrangeiros e, especialmente, pela Inglaterra, tivemos que assumir a dívida de Portugal. 1.400.000 (um milhão e quatrocentos mil libras) para pagamento da dívida com a Inglaterra, mediante financiamento com Rotschild & Sons.
Durante muito tempo o grande credor mundial era o Fundo Monetário Internacional – FMI (entidade criada em 1944 em Bretton Woods) que, através de seu banco o Banco Mundial emprestava dinheiro aos países para financiamento de produção ou para equilíbrio de contas, para depois, efetuar o pagamento dos juros pactuados.
A partir daí, a dívida foi sendo satisfeita e aumentada.
Fiscus e aerarium. Historicamente, faz-se distinção entre fisco e erário. O fisco atendia ao imperador; o erário as despesas públicas.
Classificação. Interna – credores nacionais. Externa – credores internacionais. Contratual – de obrigações recíprocas ou mobiliária – alienação de títulos (oferta pública – leilão ou direta – decorrente de determinação legal). A dívida pode ser consolidada – de longo prazo (mais de doze meses) e flutuante – deve ser liquidaçãa no mesmo exercício financeiro (menos de doze meses). Decorre do art. 29 da LRF. A flutuante vem de antecipação de receita (art. 38 da LRF).
A classificação nunca é certa ou errada. Decorre de sua utilidade. Se convier para compreensão da matéria, é útil.
O não pagamento da dívida. Os países e Estados-membros e Municípios assumem compromissos financeiros. Se o pagamento ocorrer, extingue-se a obrigação; caso contrário, surge a dívida.
Intervenção federal. Cabe falência de ente estatal? No caso de entes federados, o cabível é a intervenção federal no caso de dívida fundada (letra a do inciso V do art. 34 CF).
No caso do Estado, resolve-se o problema por mediação. Acordo.
Pode ocorrer o repúdio, moratória ou bancarrota. Situações dramáticas para Estados insolventes. Mas, de qualquer maneira, tudo se resolve de acordo com regras e tratados internacionais. A Rússia repudiou a dívida dos Czares.
O débito de precatórios. Entende-se que não se cuida de dívida. Há discussões a respeito.
Empréstimo obtido sem autorização legislativa. O endividamento é autorizado por via legislativa. Mas, pode ocorrer que seja obtido sem tal providência. E daí? O débito é devido e deve ser pago, seja por vias amistosas ou judicial.
Operação de crédito. A operação de crédito foi definida na Lei de Responsabilidade Fiscal (lei complementar n. 110). Na Resolução n. 43 é assim conceituada: “os compromissos assumidos com credores situados no país ou no exterior, em razão de mútuo, abertura de crédito, emissão e aceite de título, aquisição financiada de bens, recebimento antecipado de valores provenientes da venda a termo de bens e serviços, arrendamento mercantil e outras operações assemelhadas, inclusive com o uso de derivativos financeiros (art. 3º).
Há situações que a lei equipara às operações de crédito – recebimento antecipado de valores pela Petrobrás, por exemplo, confissão de dívida, aceite ou aval de títulos de crédito.
Dívida pública odiosa ou arbitrária. Pode ocorrer que grupos que assumem o governo não ajam com correção e assumam dívida sem fundamento e se apropriem dos recursos. Há o Pacto de Viena sobre Tratados já incorporado ao direito brasileiro (decreto 7.030/2009) que dispõe a respeito. Erro, dolo, corrupção podem ser causas de nulidade. Em verdade, a solução será sempre política. Imaginemos Maduro e Venezuela. Pode haver o repúdio. O México não pagou a dívida assumida pelo Imperador Maximiano.
Solução política. Não pode haver coação nem agressão física.
Democratização da dívida. Significa a pulverização dos créditos públicos em mãos de credores plurais.
Dívida perpétua. Emissão de títulos que não vencem, mas geram o pagamento de juros mensais ou anuais. Fica a critério do governo efetuar o resgate. Pode ocorrer a amortização, isto é, o governo pode sortear títulos paga pagamento ou pode haver a amortização mensal em pagamentos parciais.
Conversão. O governo pode converter a dívida em outros títulos por juros menores.
Lei complementar vs. Resolução do Senado. O art. 163, inc. II estabelece que LC disporá sobre a dívida pública. Normas gerais. O art. 52, V outorga competência ao Senado Federal para autorizar atos específicos que compreendem a dívida.
O inciso III do art. 163 estabelece que cabe à lei complementar dispor sobre concessão de garantias da dívida. O inciso VIII do art. 52 estabelece caber ao Senado fixar os montantes.
Contratos secretos. Lei n. 12.527/2011. Documentos podem ficar excluídos do conhecimento de todos. Depende do sigilo que sobre ele deve recair. Foucault estuda o assunto sob a ótica da preservação do Estado (“Segurança, território e população”, ed. Martins Fontes, 2009). É a razão de Estado.
Art. 5º , inciso XXXIII. Tudo é público, exceto informações imprescindíveis à segurança da sociedade e do Estado.
Papel do Senado Federal. O controle da parte financeira cabe ao Congresso Nacional (inciso II do art. 48). Todo controle cabe ao Senado Federal, por força do art. 52 e seus incisos. Todas as operações de crédito dos quatro entes federativos incumbe ao Senado. O Senado edita resoluções que disciplinam os requisitos para deferimento das pretensões de assunção de dívidas. Resolução – ato típico do Senado para resolver pendências financeiras.
Assunção de obrigação sem autorização do Senado invalida o contrato? O contrato não estará nulo, mas padece de regularidade para ser executado no Brasil.
Cabe ao Senado “fixar, por proposta do Presidente da República, limites globais para o montante da dívida consolidada da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (inciso VI do art. 52). As Resoluções já foram expedidas e disciplinam o montante que pode ser assumido para cada ente federativo. O que ainda permanece em aberto é o montante da dívida da União.
Cabe, ainda, dispor sobre limites globais e condições para operações de crédito interno e externo dos entes federativos, bem como dos entes estatais (inciso VII do art. 52). Da mesma forma, cabe ao Senado dispor sobre a prestação de garantias da União aos entes federativos (inciso VIII do art. 52). Por fim, deve estabelecer limites para o montante da dívida mobiliária (inciso IX do art. 52).
Limites da dívida pública e das operações de crédito. O art. 30 da LRF dispõe sobre o assunto, mas até hoje o Presidente da República não enviou o limite para o endividamento da União. A Resolução n. 43/2001, com alterações posteriores, disciplina a matéria.
Operações de crédito por antecipação de receita. Tais operações não estão submetidas à Resolução do Senado Federal. O parágrafo 8º do art. 165 cuida do assunto e diz respeito às operações realizadas em decorrência da aplicação da lei orçamentária.
Garantias em operação de crédito. Cabe também ao Senado “dispor sobre limites e condições para concessão de garantia da União em operações de crédito externo ou interno” (inciso VIII do art. 52).
O parágrafo 4º do art. 166 dispõe: “É permitida a vinculação das receitas a que se referem os arts. 155, 156, 156-A, 157 e alíneas a, b, d, e e f do inciso I e o inciso II do caput do at. 159 desta Constituição para pagamento de débitos com a União e para prestar-lhe garantia ou contragarantia”.
Os entes federativos, dentro de sua autonomia podem celebrar contratos e assumir obrigações e dívidas. Por vezes, especialmente quando se trata de contrato externo, o Estado ou entidade financeira exige o aval da União. Examinadas as hipótese e concordando em conceder a garantia, pode o ente federativo vincular parte das receitas previstas nos artigos mencionados para honrar compromissos com a União.
Cabe ao Senado estabelecer as regras para que isso ocorra.
Perdão da dívida. Pode o Brasil perdoar crédito que tem com Estados estrangeiros ou quaisquer débitos? Como perdoar a dívida do Rio Grande do Sul? O Executivo tem a iniciativa privativa para propor o perdão. Lei n. 9665 de 1998 estabeleceu critérios para concessão de remissão parcial de créditos, receber títulos da dívida externa do Brasil e negociar títulos de crédito. A matéria está disciplinada na Resolução 43 do Senado Federal.
Execução dos contratos. Cláusula pacta sunt servanda e rebus sic stantibus. Todos os contratos de que o Brasil é signatário destinam-se a ser cumpridos. Pacta sunt servanda. Pode ocorrer bruscas transformações e aplica-se a cláusula rebus sic stantibus.
A boa-fé tem ampla aplicação nos contratos. É a presença ética em suas cláusulas. Aplica-se o favor debitoris, ou seja, a parte mais fraca deve ser tutelada, devendo ser aplicada a execução menos gravosa. Também o beneficium competentiae, isto é, não se pode reduzir o devedor à insolvência.
O país devedor tem que cumprir as obrigações assumidas, o mesmo se dizendo de todo devedor individual.
Para isso há as previsões legais para que o empréstimo possa ser concedido, isto é, impõe-se a análise da situação econômico-financeira do devedor.
Operações internas de crédito. O art. 32 da LRF estabelece a competência do Ministério da Fazenda para realizar o controle. Não há necessidade do controle do Senado.
O art. 35 da LRF impede operações de crédito entre os entes federativos.
Limites globais para o montante de débito da dívida. O Senado deve dispor sobre tais limites. Já existe Resolução do Senado (n. 40/2001) para delimitar o montante da dívida dos Estados-membros, do Distrito Federal e dos Municípios.
Ainda não há Resolução para disciplinar a dívida da União, porque depende de proposta do Executivo. Ademais, nos termos em que andam a economia do país, tentou-se um teto, depois um arcabouço, mas sempre o teto é ultrapassado. A dívida atinge patamares dramáticos.
Autorizações para operações externas. Incumbe ao Senado Federal autorizar as operações externas (inciso V do art. 52). A Resolução n. 48/2007 dispõe a respeito. Há formalidade e procedimento para obtenção da autorização senatorial.
Consolidação e reescalonamento das dívidas. A lei n. 8388-91 estabelece condições para revisão, consolidação e reescalonamento das dívidas.
Limites para prestação de garantias por parte da União. O inciso VIII do art. 52 estabelece a competência do Senado para estabelecer limites para que a União assuma o compromisso de pagamento da dívida assumida por Estados e Municípios.
Limites globais e condições para o montante da dívida mobiliária dos entes federativos. A EC 109/2021 estabeleceu condições para que os entes federativos pudessem enfrentar as consequências da pandemia. O essencial é que a dívida seja sustentável.
Operações de crédito por antecipação de receita. Não se cuida de dívida pública, mas operação para suprir eventual quebra de arrecadação, o que obriga Municípios e Estados a valerem-se de empréstimo para pagamento no mesmo exercício financeiro. OPERAÇÕES ARO.
Títulos da dívida pública para garantia de débitos. O Estado pode emitir títulos para arrecadar recursos. Fixa prazo e ao final, resgata-os. Obrigações do Tesouro Nacional. São imprescritíveis. Títulos antiquíssimos, embora resgatáveis, não podem ser dados em penhora. O STF assim já entendeu.
Podem ser emitidos títulos para pagamento de desapropriação para fins de reforma agrária (art. 184 da CF).