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Voluntariado jovem e a construção do indivíduo – por Luciana Bernardo

A parcela de pessoas que fazem trabalho voluntário no Brasil registrou em 2022 a sua maior fatia em três anos. Na prática, foram 7,3 milhões de pessoas a realizar trabalho voluntário, de acordo o IBGE. Deste total, apenas 2,5% no total possuem entre 14 anos e 24 anos. Outro estudo, como a Pesquisa Voluntariado no Brasil 2021, divulgada no ano passado, mostra que a parcela de voluntários de 18 a 29 anos de idade diminuiu substancialmente entre 2011 e 2021, passando de 33% para 23%. Diante desses dados e tendo em vista que os jovens vivem um momento de explosões hormonais, de atitudes, de pensamentos, de decisões e muitas dúvidas sobre família, estudos e carreira… como atrair essa parcela da sociedade para o trabalho voluntário?

Adianto que é não é uma tarefa simples de se resolver, mas garanto que os resultados são cheios de experiências transformadoras para cada indivíduo envolvido e para a sociedade. Se é na juventude que começam os conflitos, as dúvidas e muitos questionamentos, o voluntariado ajuda os jovens, e eu posso dizer isso com toda certeza, porque iniciei no voluntariado aos 19 anos, a exercitar a empatia, de se colocar no lugar do outro. E isso os ajuda a refletir sobre as próprias decisões e de como projetar o futuro.

O voluntariado nos permite olhar além do umbigo, nos faz esquecer o eu e nos direciona para uma vida adulta, nos fortalecendo como seres mais responsáveis, pensantes, observadores e críticos. Todo esse movimento está ligado a uma transformação da sociedade, se espalha. Acredito que direcionar a juventude para o trabalho voluntário, permite aos indivíduos se engajar e enxergar outras realidades, é um exercício de cidadania na construção do indivíduo em si.

Os benefícios do voluntariado também refletem na saúde. De acordo com um estudo conduzido pela Universidade de Houston, adolescentes que atuam como voluntários tendem a sentir-se melhor tanto mental como fisicamente do que muitos dos seus pares. Também foi constatado, que os que praticaram o voluntariado durante todo o ano de 2022, apresentaram melhor saúde física, uma visão mais positiva da vida e eram menos propensos a desenvolver ansiedade, depressão ou problemas comportamentais em comparação com outros que não se voluntariaram.

Há tantos anos envolvida com o trabalho voluntário, hoje sou diretora da Associação Viva e Deixe Viver, que atua com contação de histórias para crianças e adolescentes hospitalizadas, e pelas pesquisas que desenvolvemos, percebemos que o voluntariado é mais frequente entre mulheres e pessoas mais velhas, acima dos 35 anos. São pessoas que estudam, tem uma vida corrida e que despertaram para os benefícios que essa atividade possui, muitas vezes por gratidão a tudo que a vida os proporciona ou proporcionou. Isso é muito bom, mas o nosso dever é estimular esses despertar o quanto antes.

Aqui no Brasil, principalmente, onde não temos uma cultura milenar, como nos países desenvolvidos, é mais difícil atrair os jovens. Se você não tem um pai, uma mãe, um familiar, alguém que traz você para esse mundo, realmente fica cada vez mais distante. Eu tive uma mãe que era muito religiosa, e motivada por ela, comecei a voluntariar na parte espiritualista. A grande maioria vem daí. Por isso existem muitos projetos, de tantas religiões, que tornam as pessoas mais próximas dessa realidade, de doar o seu tempo, a sua atenção ao outro, principalmente, aqueles que necessitam.

Temos alguns movimentos de incentivo ao voluntariado por parte das empresas e das universidades, como, por exemplo, as atividades extensionistas. Ainda que muito pontuais, fazem parte de um processo de transformação. Mas que ganhariam forças com o governo, em todas suas esferas, despertando para algumas realidades e investindo em disciplinas que ensinassem os jovens sobre ações e práticas sociais, algo prático, que os fizessem colocar a mão na massa.

Escolas, empresas, a família, todos têm sua relevância em estimular o voluntariado. Porque se na família não tem um modelo, na empresa, onde o jovem começa como estagiário ou trainee, ou na escola terá. O jovem vai a primeira vez, pinta uma parede, conta uma história, vê o quanto aquela atitude transforma vidas, ele vai querer sentir aquela emoção novamente.

A gente cresce se colocando no lugar do outro e tentando ajudar de alguma forma. Isso é um dos maiores exercícios de cidadania que o ser humano pode experimentar.  Então, quanto mais cedo a gente atrair e formar seres humanos a ter esse olhar, muito maiores serão as chances de ter um mundo transformado e melhor para viver.

* Luciana Bernardo é diretora Executiva da Associação Viva e Deixe Viver

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