Home / Opinião / Investimentos sempre são necessários. No caso da infraestrutura logística brasileira, são imprescindíveis – por Paulo Roberto Guedes

Investimentos sempre são necessários. No caso da infraestrutura logística brasileira, são imprescindíveis – por Paulo Roberto Guedes

Como todos já sabemos, os níveis de investimentos no Brasil, já há algum tempo, estão muito abaixo da média mundial e, para piorar, significativamente distantes daqueles exigidos para acelerar o crescimento e o desenvolvimento do País. As explicações para isso são as mais diversas possíveis. E todas convencem.

Ainda recentemente, o FIPE (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) publicou relatório que trata dos níveis de “gastos” com bens de capital, tais como máquinas, equipamentos, construção civil e ativos necessários para o crescimento da capacidade produtiva de um País. Conhecido como FBCF (Formação Bruta de Capital Fixo) e medido como percentual do PIB de cada País, o índice de FBCF brasileiro, de 2023, foi de 16,4%, enquanto a média mundial foi de 26%. E a estimativa para 2024 ainda é de percentual muito baixo: 17% do PIB.

Para que se tenha a dimensão desses percentuais, dentre 143 países pesquisados pelo Banco Mundial, relativo ao ano de 2023, o Brasil ficou em 124º lugar. Abaixo da América Latina (19,1%), Uruguai (17,4%), Argentina (18,6%) e Índia (30,8%), por exemplo. Apenas para ficarmos em períodos mais recentes o Brasil já alcançou, em 2013, índice de FBCF equivalente a 20,9% do PIB.

Não há por que estranhar, por exemplo, que nossos índices de investimento em infraestrutura, especificamente, também sejam muito menores do que o desejado. Considerando as áreas de energia elétrica, telecomunicação,
saneamento e transporte, os investimentos realizados em infraestrutura, em 2022, foram equivalentes a 2,32% do PIB. Em 2023 a 2,23% e em 2024 a 2,27%. A estimativa para 2025 é chegar aos 2,19% do PIB. Como se percebe,
índices muito baixos e ‘sem força’ para crescer.

Segundo Cláudio Frischtak, economista e especialista no assunto (1), os investimentos em infraestrutura de 2024, de R$ 266,8 bilhões, equivalentes a 2,27% do PIB, estão muito distantes dos 4,65% aa. para que, num período de 20 anos, o Brasil pudesse alcançar um nível de estoque desejável, ou seja equivalente a 63,7% do PIB. Para que se tenha uma ideia, o estoque de infraestrutura atual do Brasil (2024), é de apenas 35,3% do PIB. A projeção para 2025, considerando que os investimentos não deverão ultrapassar os 2,19% (cerca de R$ 277,9 bilhões), é a de que nosso estoque seja equivalente a 35,2% do PIB. Portanto, ainda longe do chamado “estoque alvo” aqui já citado.

Menos a se estranhar, ainda, e até por consequência, são os baixos índices de investimento voltados à expansão e ao desenvolvimento da infraestrutura logística que, se na década de 1971/1980 alcançou uma média anual de 2,03% do PIB, e na década seguinte (1981/1990) chegou a 1,48%, agora em 2024 não superou 0,721%. Queda substancial!

Ora, a logística, de forma integrada e que engloba todas as atividades necessárias para a movimentação de mercadorias, desde sua origem até o consumo final, tais como o transporte, em todos os seus modais, os sistemas de armazenagem e de depósitos, de todos os tipos e gêneros de mercadorias, a administração de estoques e a administração geral, que ainda incluem gerenciamento de riscos, seguro, sistemas de informação, documentação etc. etc., exige uma infraestrutura específica e adequada (2), de forma a prestar serviços com eficácia (3) e baixos custos (4). E para isso, sem dúvida, há a necessidade de investimentos em percentuais muito acima daqueles obtidos nos últimos 40 anos.

Há que se considerar, também, que em face da evolução tecnológica e do desenvolvimento de novos processos utilizados na logística, o conceito de infraestrutura logística se ampliou, pois agora também devem ser incluídas, por exemplo, as redes digitais, os sistemas de energia limpa, o espaço e os corredores para carregamento de veículos elétricos, cabos de fibra ótica e usinas de energia renovável. Como escreveu a McKinsey em seu site no dia 17.09.25, será exigido, também, “uma mudança fundamental de mentalidade, seja de governos, investidores e operadores”, uma vez que precisarão “adotar a colaboração intersetorial”, já que “à medida que os setores de infraestrutura evoluem, suas interseções estão se tornando tão importantes quanto suas trajetórias individuais” (5).

Por diversas vezes, e creio que há mais de vinte anos, eu tenho escrito sobre o assunto e realçando a necessidade de se ter, num prazo mais longo, investimentos para a expansão e a modernização da infraestrutura brasileira.

Creio não haver quaisquer dúvidas de que o desenvolvimento e o crescimento econômicos somente poderão ser alcançados e sustentados quando as condições econômicas e sociais possibilitarem investimentos significativos e
eficazes, em projetos e programas que tenham como objetivo o aumento da produtividade dos fatores de produção. E se já é preciso priorizar investimentos em educação, saúde e segurança, investir em infraestrutura
(saneamento, energia, telecomunicação e transporte) também passou a ter importância fundamental, pois precisamos sair desse “atraso logístico” (6).

Com as exceções de sempre, a forma como a infraestrutura de transporte tem sido tratada pelos governos que passam, e considerando que o setor ainda carece de verdadeiros líderes (menos míopes e mais comprometidos com os reais interesses do setor e do Brasil), vem indicando, de forma inequívoca, que o encaminhamento de soluções, e elas existem, para os problemas do setor, já há algum tempo, tem sido postergado para o futuro. A concreta e real queda dos níveis de investimentos, como aqui citado, demonstra isso.

Fazer com que as agências reguladoras, por exemplo, desempenhem um papel mais inovador e adaptado à nova realidade que se apresenta, operacionalmente cada vez mais complexa e exigindo novas relações com as concessionárias, que precisam oferecer, sem dúvida, maior qualidade nos serviços prestados e preços justos e corretos, ainda é uma necessidade urgente.

Por outro lado, a dificuldade para a obtenção de dados fidedignos e mais abrangentes, quando se compara com aqueles atualmente existentes, a baixa utilização de instrumentos mais modernos de administração e controle, e a falta de planejamento estratégico, impedem que se estabeleçam diretrizes claras, integradas e intersetoriais para o setor, bem como a implantação de sistemas com maior governança.

Portanto, se algumas das tendências mundiais dos próximos anos se confirmarem (aumentos nas demandas por energia, alimentos e infraestrutura social, impacto crescente da tecnologia nos processos produtivos, na vida e no comportamento do cidadão, processos produtivos mais avançados, maior urbanização, necessidade de se buscar maior equilíbrio ambiental e maiores exigências por segurança), bem como maiores cuidados com a saúde das pessoas e da sociedade de uma forma geral, será fundamental que as políticas voltadas ao desenvolvimento e crescimento do setor sejam convergentes, de forma a propiciar ao País, uma infraestrutura moderna e de maior qualidade.

Mas é preciso muito mais do que isso. É essencial que as políticas de melhoria e expansão da infraestrutura brasileira, tenham objetivos complementares, posto que também é preciso contribuir para a diminuição
das tensões sociais e da própria desigualdade, na medida em que além de menores custos na produção e na movimentação de pessoas e mercadorias, também viabilizará operações logísticas mais ágeis e abrangentes.

(1) Carta de Infraestrutura INTER.B (25.09.25 – Ano 12, nº 14);

(2) “Infraestrutura de transporte mal avaliada no Brasil”. De acordo com a Confederação Nacional da Indústria, via seu relatório Competitividade Brasil, mostra porque o Brasil ocupa a lamentável antepenúltima posição “no ranking que avalia a infraestrutura de transportes em 18 economias com características similares à brasileira”.

(3) No dia 20.03.25, o TCU promoveu o “Workshop Mercado Doméstico de
Cargas”
e, entre outras, “destacou que a falta de investimentos estruturais
compromete a competitividade do país no cenário internacional”.


(4) “Falta de investimento em infraestrutura aumenta custos logísticos no Brasil” é a conclusão do Relatório do TCU, que aponta impactos na competitividade e desafios no transporte de cargas doméstico (Redação em 26 de março de 2025). “O Tribunal de Contas da União (TCU) divulgou o Acórdão 2000/2024, destacando o baixo investimento em infraestrutura de transportes no Brasil. O documento aponta que o país destina proporcionalmente menos da metade do que outras nações de renda média para o setor, o que impacta diretamente os custos logísticos. De acordo com os dados, o transporte de cargas representa 64% dos
custos logísticos das empresas, e, em 2022, essas despesas corresponderam a 13% do Produto Interno Bruto (PIB), totalizando R$ 1,3 trilhão”.

(5) “Para mobilizar capital na escala necessária, as partes interessadas precisarão de estratégias claras, práticas e inovadoras. Os formuladores de políticas podem moldar a agenda priorizando verticais com base na demanda emergente, promovendo um ambiente regulatório favorável e criando condições que atraiam capital privado. Os investidores podem ampliar seu escopo buscando estratégias transversais e temáticas alinhadas às tendências de longo prazo. Os operadores de infraestrutura podem aumentar a eficiência e a resiliência de ativos integrando tecnologia em ativos e redes. A próxima década será decisiva para a infraestrutura global, e aqueles que agirem decisivamente hoje moldarão o futuro da conectividade, do crescimento econômico e do bem-estar social para as gerações futuras” (“O que é infraestrutura” – McKinsey, 17.09.25).

(6) São diversas as causas que caracterizam o “atraso logístico” brasileiro, e se compararmos, não só com relação aos países mais desenvolvidos ou emergentes do mundo, mas também com relação ao nosso próprio
desempenho anterior, constatamos o triste fato de que o Brasil, nos últimos 20 anos, investiu muito pouco em infraestrutura, não conseguindo, inclusive, suprir a depreciação natural. O resultado, como demonstram diversos estudos de Cláudio R. Frischtak, aqui já citado, foi queda significativa no estoque de infraestrutura. O estoque total de infraestrutura (saneamento, energia, telecomunicação e transporte), equivalente a 58,2% do PIB em 1983, ficou em 35,3% em 2024. O estoque de infraestrutura em transporte, que era de 21,4% do PIB em 1983, alcançou
pouco mais de 11% em 2024.

Marcado:

Deixe um Comentário