Entrevistado pelo jornalista Hugo Henud, de “O Estado”, o cientista político Steve Levitsky, professor da Universidade de Harvard e autor de “Como as democracias morrem”, declarou que “Supremo precisa conhecer seu lugar na democracia” (3/6, pág. A8). Ao responder como vê a possibilidade de o Congresso Nacional determinar mandatos para ministros do STF, respondeu com cautela, de forma indireta, sem emitir opinião objetiva. Lembrou que “Nos Estados Unidos não há idade para aposentadoria e não existem limites de mandato. Os juízes permanecem no Tribunal por toda a vida. Os Estados Unidos são a única democracia em que isso acontece. A maioria das democracias têm limite de mandato ou uma idade de aposentadoria”.
Embora ambos os países sejam democracias e adotem o regime capitalista, são escassas as semelhanças entre o Brasil e a América do Norte, a começar pela Constituição. A norte-americana é antiga, com poucos artigos, resistente a mudanças, enquanto no Brasil já nos encontremos na oitava, sendo a de 1988 a mais prolixa, frágil e instável. Sofreu, até este momento, mais de 120 emendas, com outras tantas a caminho.
De conformidade com o artigo 153 da Constituição Imperial, de 25/3/1824, “Os Juízes de Direito serão perpétuos; o que todavia, se não entende que não possam ser mandados de uns para outros lugares pelo tempo e maneira que a lei determinar”. Na Constituição de 1891, segundo disposição do artigo 57, os juízes federais eram vitalícios, perdendo o cargo unicamente por sentença judicial.
Em sentido semelhante prescreveram a Constituição de 1934 (artigo 64), a Carta Constitucional de 1937 (artigo 91), as Constituições de 1946 (artigo 95), de 1967 (artigo 108), a Emenda nº 1/1969 (artigo 113), e a vigente Lei Fundamental, promulgada em 5/10/1988.
Vitaliciedade, inamovibilidade, irredutibilidade de vencimentos, são apanágios dos integrantes do Poder Judiciário, conferidos pelo povo, representado pelos eleitos à Assembleia Nacional Constituinte. Assim se determina como garantia de poderem julgar com independência e sem temer medidas vingativas. O juiz é a lei que fala, já se dizia na Roma antiga.
Durante regimes de exceção, as constituições de nada valem. Tivemos magistrados afastados compulsoriamente pelo Alto Comando Revolucionário, logo após o golpe de 31 de março 1964. Lembremo-nos dos Atos Institucionais 1, 2 e 5, suspendendo garantias de vitaliciedade, inamovibilidade, estabilidade, e concessão do habeas corpus.
Na visão do professor Steven Levitsky, o STF foi fundamental para conter a escalada autoritária durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro. Entretanto, “O Supremo brasileiro foi muito agressivo, muito audacioso em expandir o seu papel, talvez além do que deveria, além do seu papel normal, em nome da defesa da democracia”.
Duas observações me ocorrem: o cientista político não conhece a nossa história. Pouco sabe a respeito do Supremo. É provável que as informações de que dispõem se limitem aos governos Dilma, Bolsonaro e Lula. Não bastasse, como visitante de passagem pelo Brasil foi indelicado ao proceder como censor do órgão de cúpula do Poder Judiciário.
O Judiciário é Poder inerte, até que alguém, pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, dotado de legitimidade e fundado interesse, ingresse, por exemplo, com Ação Direta de Inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual ou ação direta de constitucionalidade, conforme o texto do artigo 102 sobre as competências do STF.
O regime democrático faculta aos brasileiros, de todas as camadas sociais e posições políticas, analisar, apoiar ou criticar a conduta dos integrantes dos Três Poderes. Não há necessidade de ajuda externa.
Se Emenda a Constituição vier a determinar mandato de 4, 8, 10 ou 12 anos para os Ministros do Supremo, como ficará a vitaliciedade dos Ministros dos Tribunais Superiores, dos Desembargadores dos Tribunais Regionais, dos juízes de primeiro grau, dos integrantes do Ministério Público? Apenas os primeiros serão investidos no cargo por período limitado? Essa é a complicada questão.