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500 mil desempregados – por Almir Pazzianotto

O jornal “O Estado”, na edição de 27/10, páginas C/6 e C/7, transcreve artigo de Karen Weise, publicado no The New York Times, com o título Robôs devem eliminar 500 mil empregos na Amazon.

Observe o leitor não estarmos diante do velho e conhecido fenômeno da rotatividade. A empresa não pretende substituir os demitidos. As vagas abertas não serão preenchidas por novos empregados. Desaparecerão, ocupadas por equipamentos eletrônicos de última geração, produzidos e dirigidos pela Inteligência Artificial (AI).

Diz o artigo de Karen Weise: “Nas últimas duas décadas, nenhuma empresa fez mais para moldar o mercado de trabalho americano do que a Amazon. Em sua ascensão para se tornar o segundo maior empregador do país, ela contratou centenas de milhares de trabalhadores de centros de distribuição, formou um exército de motoristas contratados e foi a pioneira no uso de tecnologia para contratar, monitorar e gerenciar funcionários”. Diante, porém, de necessidades impostas pelo mercado, multiplicará a utilização de recursos da informática, substituindo “mais de meio milhão de empregos por robôs”.

No Brasil, um dos maiores empregadores são os Correios, empresa estatal fundada em 1663, hoje com aproximadamente 84 mil servidores regidos pela CLT. Corre a notícia de que serão privatizados. Um dos obstáculos consiste na necessidade de redução do excessivo número de empregados, com a utilização de Planos de Demissões Voluntárias (PDV). A medida depende de acordo coletivo com o sindicato da categoria, com enorme dispêndio do dinheiro que os Correios não têm.

Na primeira Revolução Industrial, tivemos o trabalho humano substituído pela ferramenta e pela mecanização. Um século depois veio a automação e, mais tarde, a robotização. Hoje a ameaça é representada pela Inteligência Artificial, que passa a concorrer com engenheiros, advogados, juízes, procuradores, médicos, ignorando-se até
onde poderá chegar. Lê-se na página BI do Caderno Economia & Negócios do mesmo jornal, edição de 25/10, que a “Adoção de inteligência artificial já tem impacto em postos de trabalho no País”. Não há setor imune à permanente modernização. Agências bancárias continuam a ser suprimidas. Ordens de pagamento e cheques são coisas do passado. Nas redações de jornais dezenas de profissões foram dizimadas. O mesmo acontece na indústria automotiva, em grande parte robotizada e terceirizada.

Nos distantes anos de 1987/1988, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte, deputados e senadores redigiram a Constituição ade 1988. O inciso XXVII do art. 7º incluiu, entre as garantias dos trabalhadores urbanos e rurais, “a proteção em face da automação, na forma da lei”. Na década de 1980 a robotização dava os primeiros passos, e a Inteligência Artificial continuava nos limites dos centros de pesquisa. Assim não fosse, participariam do extravagante texto constitucional.

O que se sabe é que o referido dispositivo tem se revelado tão inútil quanto os incisos I e IV do mesmo artigo 7º. O primeiro relativo à proteção da relação de emprego contra despedida arbitrária ou sem justa causa, “nos termos de lei complementar”, e o segundo na definição de salário-mínimo. Passados mais de 35 anos, desde a promulgação, a lei complementar prometida pelo inciso I não existe nem sequer em projeto e o salário-mínimo mal dá para o sustento do chefe de família.

A Constituição inclui, entre os Princípios Fundamentais (art. 1º), “os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa”, coloca o trabalho entre os direitos sociais (art. 6º), e determina a “busca do pleno emprego” como um dos Princípios Gerais da Atividade Econômica (art. 170, VIII). Entre as utopias, não criou a estabilidade no emprego, ou proibiu demissões. Respeitou, enfim, a necessidade de as empresas ajustarem o quadro de funcionários as necessidades da produção, ficando a proteção em face da automação para futuro incerto e não sabido.

O desemprego é fenômeno real e duradouro. Nada tem a ver com a luta de classes, fenômeno ignorado no Brasil. Relaciona-se com o desenvolvimento da tecnologia da informação, responsável pelo trabalhador desalentado. Quem perder emprego com mais de 40 anos não conseguirá nova colocação. Restar-lhe-a chance de encontrar serviço como Uber ou PJ.
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Advogado. Foi Ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho.
Integra as Academias Brasileira e Paulista de Direito do Trabalho.

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