No clima de violência que o país experimenta, programa policial é uma forma das pessoas se sentirem ouvidas, atendidas, em seus reclamos de segurança. Dependendo do apresentador, em certos casos, lá vem a famosa frase: “precisamos de pena de morte no Brasil”. Muita gente até concorda. Em linhas gerais, na história, Rousseau era favorável à pena de morte, para salvaguardar a sociedade. Beccaria era contra, e apresentou lá as suas razões em várias oportunidades. Acho que todos nós temos um pouco de Rousseau e um pouco de Beccaria em nosso dia-a-dia. Queremos e não queremos pena de morte. Será que desejamos mesmo tirar a vida de outrem, por mais abjeto que seja? Com certeza, o que se precisa, e com urgência urgentíssima, é alterarmos esse código penal, do tempo em que o capeta era menino, e mexer lá no 121, por exemplo, com penas mais duras, sérias e sem benefícios.
Nos muitos anos de mim mesmo (os 84 já começam a pesar) vivi muita coisa e já senti, ainda que por um momento, vontade de aplicar a tal de pena de morte. Já vi algumas vezes pessoas que, depois de muita expectativa, depois de muita espera e sofrimento nas filas, consegue um transplante de qualquer órgão. A classe médica brasileira e todas as equipes envolvidas em transplantes, sentem-se recompensadas a cada alta médica, de alguém transplantado, pronto para enfrentar um novo desafio na vida. Observamos rostinhos de crianças felizes, de familiares sorridentes e esperançosos, depois de tanta dor; expressões de alívio de adultos, homens e mulheres, tudo isso a gente vê nas matérias a respeito dos transplantados no Brasil.
É exatamente a partir daí que começa a nossa revolta, o nosso desejo intempestivo e momentâneo de clamar por pena de morte. Tão logo passa a euforia, vem o desespero de transplantados e familiares. Receita médica na mão, vão aos órgãos públicos responsáveis para buscar a medicação que lhes permitirá voltar à vida normal, o medicamento que evitará a rejeição ao novo órgão. A resposta, na grande, mas na grande mesmo, maioria das vezes é “está em falta, volte a semana que vem, quem sabe”. E as pessoas não tem dinheiro para ir à farmácia comercial comprar o remédio, caríssimo. E bate o medo, o pavor de que tudo se perca. Simplesmente porque o ministro, o secretário, sei lá quem, não ajeitou a verba para a compra dos remédios. Um país onde se sabe dos bilhões de reais guardados em malas em apartamentos e em contas nos paraísos fiscais, não tem um troquinho que seja, para repor alguns medicamentos básicos.
É… nesse momento eu deixo Beccaria e volto a Rousseau. Começo a pensar em pena de morte, para quem mata milhares de pessoas por ano, por falta de medicamentos; citamos alguns casos de transplantes, mas quantas crianças não estão aí em camas, com doenças tantas, que precisam de remédios, que seus responsáveis não tem condições de comprar; quantos diabéticos não ficam, até sem tirinhas para medições de nível de glicemia. A situação é caótica e poucos se dão conta do desespero de familiares. Nós nos revoltamos com pessoas sendo atendidas em macas, nos corredores de hospitais, e isso não deixa de ser válido, mas pense naqueles que estão condenados à morte, pelo simples fato de que um ministro, sei lá quem, não garantiu verba para a compra de medicamentos. Deus me perdoe, mas o desejo de pena de morte aqui, agora, é mais um reforço de ideia.
Aqueles que estão matando com a caneta, certamente vão encontrar a sua mão pesada e pagarão muito mais do que a morte desse envoltório de carne que os sustentam. Ah! o custo dos remédios já anda pela hora da morte e o governo só faz aumentar preços de tudo, inclusive dos planos de saúde. Isto é fácil fazer, que se dane o povo, ora pois, pois, como dizia o grande (põe grande nisso) jornalista Jayme Colagiovanni, em São José do Rio Preto.










