O céu é o limite de um personagem imortal. Daqui a pouco eu falo do meu inseparável colega de mil coberturas jornalísticas no Brasil e no exterior. Mais do que isso: amigo de tantas histórias na vida real. De confidências. De brincadeiras e zombaria nos bastidores do jornalismo esportivo, mas de muito comprometimento na hora do trabalho. Só vendo. Meus ex-companheiros do Estadão poderiam testemunhar. Sabem que não eu não sou de mentir. Isso nunca. Então, invadam comigo as lembranças do Mundial da Espanha-82.
Estádio Sarriá, Barcelona, Catalunha, finalíssima da Copa do Mundo: Brasil 2 x 3 Itália. Calma: não vou insistir no tropeço que mandou os donos do show de bola de volta pra casa. Nem que o implacável Paolo Rossi marcou os três gols do título. Seria desnecessário e irrelevante desenterrar tragédias. Não é mesmo? Não quero reprisar as tristes imagens que ainda continuam na memória dos chorões mais antigos. Cenas do passado. Apaguem e sigam. Nem direi – seria redundante – que os intérpretes da coreografia do mestre Telê Santana permanecem no Livro de Ouro dos maiores e melhores dançarinos dos palcos internacionais. “E daí?”, perguntariam. Será?
Quem rogou a praga? Não sei. No entanto, um dia me contaram que os deuses dos estádios recomendaram a demolição daquele cenário infestado pelos fantasmas do mal. Às vezes, não podemos contestar as lendas que propagam verdades ou calúnias. A realidade ou a ficção no meio das tempestades. Não importa mais. Afinal, aqui estou pra homenagear meu irmão Antero Greco, a exemplo do Paulo Soares, que deitou e rolou no Sport Center da ESPN. Literalmente. Reconheço que o meu tema é relatar o comportamento de um cara divertido, bem-humorado, sarrista como ninguém.
Vocês pensam que eu não citaria Fausto Silva, o Faustão de irresistíveis gargalhadas na Globo e na Band? De propósito, deixei-o para um lugar de honra de uma lista valorizada pela presença de Antero Greco.
Estamos na recepção de um hotel de Barcelona para o registro de entrada. Sai um bate-boca porque o Greco rejeitava o quarto do Faustão. Nada contra o barulhento ronco do gordo. “O Cilo tá sempre comigo. É o meu assíduo parceiro de suíte porque somos de bagunça e fica igual. Nenhum reclama do outro”, esclareceu. O capitão do grupo aceitou a explicação e nos manteve juntos, como aconteceu na etapa anterior de Sevilha.
Desorganizados? Não exagerem. Diariamente, nossos espaços eram ocupados pelos apetrechos espalhados no ambiente. Naquela noite em que fechamos a conta pra desocupar a suíte, Greco não conseguia localizar a máquina portátil de escrever que levou do Brasil. Era a ferramenta mais avançada que tínhamos na época. Detalhe: Greco mantinha o costume de comprar e de colecionar publicações do mundo inteiro. Não jogava nada fora e, pior, espremia tudo em cinco malas – de um total de oito que incluíam roupas e diversos itens – para despachar no aeroporto. Epílogo: a maquininha estava embaixo dos jornais empilhados no limite do teto. Pode isso?
Leal ao extremo. Demais. Na fase do meu processo contra o Mister Quase e respectiva gangue num treino do falido São Caetano, ele comparecia aos tribunais para me defender. Durante uma entrevista do Mister Quase nas dependências do Estadão, um dos repórteres (Eduardo Maluf) indagou qual era o estágio judicial da briga comigo. “Não vou mais comentar isso. Ele estava bêbado naquele dia”, mentiu o Rei do Vice. Ao que o Greco rebateu imediatamente. Ele (Cilo) nem bebe. Assumam que vocês (Mister Quase e demais capangas) foram covardes. A turma do “deixa disso” esfriou o clima. Lá pelos anos 90, eu vinha de uma quebradeira e iniciava meu emprego na Folha de Londrina.
A revendedora me cobrava algumas prestações atrasadas de um carro novo e, para evitar a retomada pela Justiça, Greco me emprestou R$ 5 mil. Devolvi parceladamente. Um dos envelopes chegou vazio. “Este (Cilo) não muda. É um desligado”, observou meu fiel amigo ao gerente do banco que o comunicava do imprevisto. “Nele eu confio”, afirmou Greco. O próximo depósito corrigiu a minha falha. Como rimos juntos do contratempo. Eu relataria muito mais. Daria um livro, mas aqui não seria possível. Agora, só pediria que você acorde. Veja como as pessoas não param de chorar. Abra os olhos e diga que este sono profundo não passa de uma pegadinha sem graça. Então diga. Mas, se preferir o céu, olhe no caminho como as estrelas te amam. Eu também. Até mais. A gente se vê.
SILVIO LUIZ
Como as dores de um adeus machucam e surpreendem, não há tristeza mais intensa do que a gente constatar que o Silvio Luiz – uma das celebridades da imprensa brasileira – também vai embora deste planeta. Na minha adolescência, o assistia no Quem Tem Medo da Verdade. O programa destruía discos na frente dos cantores novatos que se candidatavam à fama. Mentalize a figura de um crítico voraz, odioso, truculento. Ilusão de ótica. No futuro, passaríamos a conviver nas coberturas de futebol, especialmente do São Paulo. Simpático, educado, humilde, um gentleman. Nos reencontramos no Mundial do Mexico-86. Ele dividia-se entre o trabalho em uma TV e como colunista do Estadão. De repente, demos de frente no elevador. Me chamou pelo nome. “Que tal o meu texto no Estadão”? Imenso orgulho de ouvir isso de um personagem do nível dele. “Bom demais”, elogiei. Ele sorriu e agradeceu. Silvio: abrace o Antero e que sejam felizes para sempre. Eternamente.
Eu me lembro Nelson nós assina vamos o jornal o Estadão e eles publicavam os jornalistas que viajavam para a cobertura da copa seu nome estava lá