Este artigo é dedicado a todos os que resistem à estúpida ideia de acabar com os campeonatos regionais de futebol no Brasil. A ideia é antiga. Surgiu não apenas por estupidez ou idiotice, mas sim sob o apoio de evidentes interesses financeiros de determinados grupos. Tudo começou há 50 anos, quando começou a dar certo o casamento entre o antigo Torneio Rio – São Paulo, nascido em 1950, e a primitiva Taça Brasil, lançada em 1959. Dessa feliz união, nasceu, em 1971, filho que logo cresceu e se consolidou, o Campeonato Nacional de Clubes.
Seria desnecessário relembrar que o Rio – São Paulo ganhou o nome de Roberto Gomes Pedrosa, ótimo dirigente nascido no Rio e que criou, em São Paulo, em 1948, a Lei de Acesso para promover clubes da 2.ª Divisão à 1.ª Divisão. Em 1967, o torneio entre os dois grandes centros de futebol foi ampliado, com a entrada de dois clubes mineiros, dois gaúchos e um paranaense, e ganhou o apelido de Robertão. Do Robertão para o atual Campeonato Brasileiro, foi um pulo. E essas transformações tiveram a bênção de João Havelange, de boas e más lembranças, os interesses financeiros, estimulados pela evolução dos canais de televisão, algo que, em determinada época, multiplicou o número de clubes do Nacional, até a definição do atual modelo.
A ideia de escrever este artigo, com base em minhas lembranças de torcedor de futebol e de minha trajetória pelo jornalismo esportivo, surgiu num bate-papo com o amigo Fausto Camunha, outro apaixonado pelo futebol, hoje maestro do Orbis News.
O bate-papo com o Fausto ocorreu antes da incrível 9.ª rodada do Campeonato Paulista de 2024, em que o público foi premiado, sábado, pelos 2 a 2 de São Paulo x Bragantino, e domingo, pelos 2 a 2 Palmeiras x Corinthians. É claro que não vou entrar em detalhes sobre esses dois jogos, já tão comentados. Tecnicamente, ambos estiveram no nível atual do futebol brasileiro: limitado dentro e fora de campo. As emoções dos minutos finais das duas partidas, no entanto, colocaram em plano inferior as inúmeras falhas de jogadores, técnicos, árbitros(as) e dirigentes.
Viva o Campeonato Paulista!
Em atenção aos que não caem na estúpida onda de acabar com os campeonatos, desejo relembrar:
1 – O Brasil é um país diferente de todos os outros;
2 – Cada um dos 26 Estados brasileiros tem características próprias;
3 – O futebol de cada um desses Estados está adaptado às condições locais.
Sem qualquer regionalismo ou bairrismo, sem descontar que sou paulista e sempre morei na cidade de São Paulo, tendo viajado a mais de 500 cidades de 23 Estados e de 61 países, devo ressaltar, com base na história, nos números e na realidade, que São Paulo, com 44 milhões de habitantes e tanta expressão econômica, é um Estado diferente. E a diferença aparece também, de modo claro, no futebol.
O Estado de São Paulo é formado por 645 municípios e por dez regiões, em que se sobressaem a Capital – uma das maiores cidades do mundo – e inúmeras outras, como Campinas, Santos, São José dos Campos, Ribeirão Preto, Bauru, Marília, Piracicaba, Sorocaba, São José do Rio Preto, Araçatuba, Franca, Araraquara, Barretos, Jundiaí.
Este panorama de São Paulo se evidencia no fato de o atual Campeonato Paulista da Série A contar com os cinco clubes tidos como “grandes” – São Paulo, Corinthians, Palmeiras, Santos e Portuguesa –, com três da região do ABC (São Bernardo, Santo André e Água Santa) e com oito do Interior: Ponte Preta e Guarani, de Campinas; Botafogo, de Ribeirão Preto; Internacional, de Limeira; Novorizontino, de Novo Horizonte; Ituano, de Itu; Bragantino, de Bragança Paulista, e Mirassol. Isto sem contar que estão de fora, em divisões inferiores, muitos outros clubes que fizeram história e que foram celeiros de craques, entre os quais Ferroviária de Araraquara, XV de Piracicaba, XV de Jaú, São Bento de Sorocaba, Noroeste de Bauru, Comercial de Ribeirão Preto, América e Rio Preto de São José do Rio Preto, Paulista de Jundiaí, Portuguesa Santista e São José.
Portanto, é estupidez colocar no mesmo saco o campeonato regional paulista e os campeonatos regionais que se limitam a apenas dois ou três clubes de relativa qualidade.
Vamos combinar uma coisa: quaisquer que venham a ser os resultados das próximas partidas e qualquer que venha a ser o campeão do Paulistão, ninguém mais deve aparecer como dono da verdade para defender total atenção ao Campeonato Brasileiro. O Brasil não é a Itália, a França, a Inglaterra e a Alemanha. Nosso país precisa manter, sim, um bem cuidado campeonato nacional, mas sem afetar a sobrevivência dos campeonatos regionais, disputados no início de cada ano. A razão agradece.