O atual modelo de futebol mundial – bilionário e contraditório – sugere que os clubes abracem e papariquem os talentos do show de bola, mas ignorem os ídolos e apaguem os heróis da memória como se fossem descartáveis.
É mais fácil traduzir: é como se nada representassem. Há poucas exceções. Vejamos: o Real Madrid é de homenagear e de respeitar os personagens que lá construíram uma galeria de tantas conquistas.
O mais recente caso é o do ex-lateral Roberto Carlos, agora um influente diretor no Santiago Bernabeu. O lendário Alfredo Di Stéfano, o mais próximo do genial Pelé nos anos 60, ocupou a simbólica presidência do Real até o fim da vida. O nome dele preenche um honroso espaço no livro de ouro dos merengues. Já velhinho, o indomável artilheiro era de frequentar as cerimônias de fim de ano, em cima de uma cadeira de rodas, naquele vitorioso ambiente.
A Fiorentina também jamais deixou de reverenciar o grande Julinho Botelho, o primeiro, raro e único depois do mago Mané Garrincha. O inesquecível ponta defendeu a equipe italiana entre 1955 e 1958. Em 1996, o elegeram o melhor de todos os tempos do time azul. No Palmeiras, que um dia o empregou como técnico da base, ele compunha o supercampeão estadual de 1959 contra o Santos do Rei Pelé. Naquela mesma temporada, mais de 100 mil revoltadas vozes o vaiaram no momento em que a Seleção Brasileira acabava de entrar no gramado para um amistoso diante da Inglaterra. No fim, saiu aplaudido pelos mesmos algozes que o haviam rejeitado.
Historicamente, o Corinthians é um dos líderes do ranking da fria guilhotina que massacra, destrói e que – sem mais nem menos – estilhaça os atores da casa alvinegra. Nem Gilmar dos Santos Neves, um dos maiores goleiros do futebol brasileiro – talvez o maior – escapou da máquina desumana implantada no Parque São Jorge. Nem Barbosinha, filho de Silvio Almeida, ministro do governo Lula (Direitos Humanos). Nem Heitor. Nem o gigante Cássio. Nem o campeão mundial Danilo, o dono da bola em tantas comemorações e comandante do sub-20 no troféu da Copinha.
Nem o pequeno grande César, que acaba de falecer, abandonado num leito mortal, em Alagoas, aos 69 anos, depois de, inutilmente, pedir ajuda ignorada pelo, entre aspas, meu Timão. Nem Luisinho, o Pequeno Polegar, incomparável protagonista de uma história sem fim. Nem este nem aquele. Cada um deles diria “ah, esqueceram de mim”. Ou, pior do que isso, “me abandonaram no lixão da hipocrisia”.
Síntese: é a lei da covardia.