Devemos ter pelos integrantes do Poder Judiciário respeito sacrossanto,
impossível de ser violado. Disse alguém, e com toda a razão, que “a civilização de um
povo se mede pela opinião que se tem da de sua Magistratura”.
O jornal Folha de São Paulo publicou nesta semana pesadas acusações
dirigidas ao ministro Alexandre Moraes, integrante do Supremo Tribunal Federal (STF)
e ex-presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O conhecido magistrado tem sido
frequentador assíduo das páginas de grandes e pequenos periódicos nacionais, e das
redes sociais, pela maneira pouco ortodoxa com que se conduz nas atividades inerentes
ao cargo. É necessário recordar que a imprensa não desperdiça espaço com pessoas
comuns e procedimentos rotineiros. Se alguém é notícia, é porque algo fez, de bom ou
de mau, para merecê-lo.
Repercutindo as notícias da Folha, na edição de hoje, 14/8, página A10,
O Estado de S. Paulo estampa longa matéria sob o título: “Moraes usou TSE fora do
rito regular para investigar bolsonarista, afirma jornal”. O subtítulo diz: “Reportagem da
‘Folha de S. Paulo diz que gabinete de ministro do STF ordenou, de forma não oficial,
a produção de relatórios”. Prossegue a matéria: “O movimento, conforme o jornal, foi
ordenado por meio de mensagens para embasar decisões do próprio ministro contra
aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no inquérito das fake news e das milicias
digitais, que tramitam no Supremo”.
Integrei o Tribunal Superior do Trabalho (TST) no período compreendido
entre outubro de 1988 e fevereiro de 2002. Exerci os cargos de corregedor-geral, vice-
presidente e presidente. Retomei obras paralisadas de construção do monumental
edifício sede. Pratiquei intervenção em Tribunal Regional. Do meu gabinete jamais saiu
algo sem o meu conhecimento e a minha autorização. Para que isso acontecesse, era
auxiliado e assessorado por servidores de confiança e da mais alta responsabilidade.
Alimento a convicção de que os cuidados são idênticos nos gabinetes dos
ilustres ministros do TST, e em todos os gabinetes dos demais Tribunais Superiores e do
E. Supremo Tribunal Federal. A não ser assim, o Poder Judiciário, como um todo,
tornar-se-ia alvo de generalizada suspeição, pela parcialidade, falta de compostura e de
responsabilidade. Insisto: a tarefa jurisdicional deve ser exercida sem mácula, ou deixa
de ser jurisdição para se converter em negócio obscuro.
Na mesma página, O Estado publica aquilo que leio como peça de defesa
do ministro Alexandre Moraes. Declara S. Exa., entre outros argumentos, que “no
exercício do poder de polícia (sic), tem competência para a realização de relatórios
sobre atividades ilícitas, como desinformação, discursos de ódio eleitoral, tentativa de
golpe de Estado e atentado à democracia e às instituições”. Em síntese, poder de
investigação criminal.
Consulto a Constituição da República e a legislação eleitoral e não
encontro, entre as atribuições reservadas ao STE e ao STF, competência para exercício
de poder policial, como se fossem órgãos da Polícia Federal. Ao STF, como ao STE, a
competência se reduz a processar e julgar, dentro dos limites da lei, com imparcialidade
e sem interesse pessoal, assegurados aos acusados em geral os direitos ao devido
processo legal, ao contraditório, ao amplo direito de defesa (art. 5º, LIV, LV,), sendo
inadmissíveis “provas obtidas por meios ilícitos”.
Escreveu Karl Marx, no clássico O 18 Brumário de Luís Bonaparte, que
“quando se tenta persuadir alguém, é porque se reconhece ser ele o dono da situação”
(Editorial Vitória, RJ, 1956, pág. 71). A necessidade experimentada pelo ministro
Alexandre Moraes, de se explicar ou se justificar, o coloca em posição delicada. Não
nega as acusações. Pressionado pelas circunstâncias assume posição frágil aos olhos da
opinião pública, quando procura ser inocente.
O edifício do Poder Judiciário brasileiro apresenta fraturas nos
fundamentos. É necessário reverter ao anonimato. Ao tempo em que ministros se
manifestavam apenas nos autos, não eram íntimos de empresários e de advogados, não
assumiam posições político partidárias. Limitavam-se, enfim, à nobreza da magistratura
impessoal, célere e imparcial.
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Advogado