Maria Helena Miranda de Figueiredo. Lenita Miranda de Figueiredo. E, por um bom tempo, apenas Tia Lenita. Jornalista, escritora, pintora. Nasceu no Belenzinho, em São Paulo, em 1927. Foi uma das primeiras mulheres a exercer o jornalismo em São Paulo – começou na década de 50 – e deu prestígio ao jornal Folha de São Paulo, onde trabalhou por mais tempo. Criou a Página Feminina da Folha e o suplemento Folhinha, dirigido às crianças. “Folhinha” era a alegria da criançada e o Clube da Folhinha tinha carteirinha com foto, boné, aulas de música, balé, história, tudo ao vivo e em cores, Durante muito tempo quase uma dezena de ônibus escolares estacionavam à porta do jornal trazendo crianças e professoras para para visitarem a Folha e conhecerem Tia Lenita. Ou para as aulas. Tia Lenita era uma unanimidade.
Lenita morreu há pouco, em São Paulo, sem uma única linha de qualquer jornal; Nem do jornal ao qual ela deu seu trabalho e seu entusiasmo.
A jornalista trabalhou primeiro em rádio, depois escreveu crônicas no Diário de São Paulo, foi para O Tempo, jornal dirigido pelo grande jornalista ( e sábio!) Hermínio Sachetta. Estagiou como linotipista nas oficinas da Folha de São Paulo “com uniforme e tudo” contou-me em entrevista para meu Livro “Mulheres Jornalistas – A Grande Invasão” (Imprensa Oficial/Faculdade Cásper Líbero-2010) e um dia foi parar na redação da Folha de São Paulo, onde sua carreira deslanchou.
Depois da Folha ainda esteve no Shopping News, mais uma vez sob as ordens de Hermínio Sachetta.
Não ficou apenas no jornalismo, escreveu um romance “O sexo começa às Sete”, ganhando o prêmio Jabuti, um dos prêmios literários mais expressivos do país.
Na década de 70 foi presa – a razão talvez tivesse sido por ela ter escondido um jornalista procurado pelos homens da ditadura que se instalara em 1964. “Após três meses de torturas deixei o cárcere com 34 quilos, doente, alquebrada, com costelas quebradas a murros, um farrapo humano”, diz ela na entrevista que me deu para o livro “Mulheres Jornalistas”.
Logo depois foi demitida pela Folha.
Lenita Miranda de Figueiredo fez parte de um grupo de mulheres, em São Paulo – não mais que trinta – que abriram caminho às que vieram depois. Hoje as mulheres jornalistas são maioria nas redações de jornais, rádios, tevês, assessoria s de imprensa. Essas trinta – lá estava também, nesse grupo, esta que vocês estão lendo – foram as que abriram as portas de um mundo reservado apenas aos homens. Não foi fácil, mas sobrevivemos, sim, com coragem, persistência e até muita alegria.
Agora uma pergunta. O que faz um grupo de pessoas hoje nas redações de jornais a ignorar o passamento de uma jornalista que foi tão importante para esses mesmos jornais? Um amigo jornalista levantou a hipótese de que a família não deve ter avisado ninguém, a família teria silenciado sobre a morte de Lenita. Outro jornalista comentou que “quem procura, acha”.
Minha opinião é o descaso com a notícia. Digo a notícia com “N” maiúsculo. Qualquer cantorzinho de… (eu ia dizer um palavrãozinho, um só, muito conhecido, mas me contive!) que estica as canelas merece até páginas inteirinhas. Se for “sertanejo”, então, Deus nos acuda! E morre uma jornalista da importância de Lenita Miranda de Figueiredo e nem uma linha?
Ah! Meus sais! Se naqueles tempos sem nenhuma tecnologia a gente não deixava passar uma notícia em branco o que acontece hoje em que a internet tudo vê, tudo sabe, tudo conta? Conta até fake news!
Eu lamento. Fico triste. E aproveito este site para prestar homenagem à jornalista Lenita Miranda de Figueiredo, que fará falta em nossas reuniões na Academia Paulista de Jornalistas.
Um PS, antes que me interpretem mal: falei pejorativamente de cantores sertanejos, essa música esquisita que toca hoje em todos os lugares. Não confundam com música caipira, essa, sim, digna de aplausos. Música caipira, das nossas raízes, essa sim, é boa! Explicado?
Regina Helena de Paiva Ramos, jornalista e escritora