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O capitalismo predatório e a destruição ambiental – por Gilberto Natalini e Marcos Eduardo de Oliveira

Para início do debate, ninguém esconde que é fundamentalmente decisivo entender qual a nova realidade que está surgindo, em tempos de emergência climática (assunto ainda desconhecido para mais de 30% da população brasileira, de acordo com pesquisa recente) e em tempos de muita tecnologia em que o principal fator de produção é o conhecimento.

Seja como for, a questão, em linhas gerais, ganha a seguinte formatação: lá fora há um capitalismo devorador de recursos (modo de produção com sua lógica intrínseca de maximização do lucro) que provoca, na base, uma crise civilizatória, e que não hesita em jogar para escanteio a preocupação ecológica.

Mais do que isso, pensando primeiramente nos desdobramentos de nossa realidade particular, esse típico, influente e dominante modelo (por certo, o elemento principal que promove a relação destrutiva do potencial ecológico) submete, entre outros, a floresta amazônica aos ditames do agronegócio (no Brasil, nunca é demais frisar, a agropecuária responde por cerca de 96% da área desmatada no Brasil, segundo o Relatório Anual do Desmatamento 2022).

Assim sendo, e insistindo no assunto, falamos de uma dinâmica do capitalismo que, no fundo, parece que se especializou em queimar e desmatar a vegetação nativa para facilitar a expansão da fronteira agrícola; que ameaça milhões de espécies de plantas e animais; que transforma a riqueza verde do mundo vivo em commodities.

Sem ineditismo, nesse ambiente complexo, importa destacar que a desigualdade explosiva e a crise ambiental devastadora são, sim, em nosso caso, os nossos mais imediatos desafios.

Por isso se diz às claras que, num mundo em que as aplicações financeiras rendem mais do que investimentos em produção, a crise do meio ambiente, aqui ou acolá, permanece presente.

Recorte feito, é certo que as principais mudanças globais aceleram a crise ambiental (o caos socioambiental).

Não por acaso, olhando agora para a economia global e usando outros termos, os 110 trilhões de dólares de bens e serviços produzidos anualmente no planeta colocam em evidência o nível de devastação deixado na natureza, sempre exigida para comportar o tão aclamado crescimento econômico.

Mas, vejamos: até certo ponto, trata-se de um crescimento que, com a força das evidências, atende cada vez mais a parte (rica e abastada) acomodada no andar de cima da pirâmide.

Os mesmos, como é sabido, que prontamente danificam toda a causa ambiental.

Por esse lado, tomando os dados mais atuais e colocando-os em perspectiva, não é segredo o que está devidamente destacado no estudo Climate Change And The Global Inequality of Carbon Emissions (Chancel, 2022): os 10% mais ricos são responsáveis por cerca de 20 vezes mais emissões em comparação com os 50% mais pobres em escala global.

Tudo interligado e relacionado. Tudo generalizado em termos de crises ambientais contemporâneas. Exploração, dominação, devastação e acentuada piora do meio ambiente e da qualidade social da vida moderna. Vivemos, pois, uma situação de urgência.

Ladislau Dowbor, olhando para a outra ponta dessa mesma história, levanta uma oportuna provocação em seu recente trabalho Os desafios da revolução digital: “apenas as pessoas mais alienadas não se dão conta da catástrofe que representa a convergência de desastres ambientais, desigualdade explosiva, caos financeiro e violência generalizada.

Nesse conjunto de relações e ações conturbadas, “tanto a desigualdade extrema quanto a destruição ambiental não são defeitos do sistema, mas a sua característica”, assim reconhece em forma de relatório o Unrisd, Instituto de Pesquisa das Nações Unidas para o Desenvolvimento Social, criado em 1963 e sediado em Genebra.

De toda sorte, vamos lembrar dos aceleradores da crise ambiental reconhecidos pela ONU que inclui, sobretudo, a degradação da natureza, o rápido desenvolvimento de tecnologias como a Inteligência Artificial (transformação digital), a competição por recursos naturais, o aumento das desigualdades e a diminuição da confiança nas instituições.

Nessa direção, não se pode perder de vista que o aumento por recursos hídricos e minerais críticos e por elementos de terras raras, de um jeito ou de outro, acabam condicionando novas pressões sobre a base ecológica conhecida.

Na maioria dos casos, mesmo que não haja consenso, convém dizer que, pelas mãos da sociedade capitalista (o modus operandi é próprio: mais aumento de extração, mais produção, mais acumulação), degradação (e rupturas) de ecossistemas, perda de biodiversidade (a partir da exploração excessiva de recursos naturais e da eliminação de habitat), alterações nos padrões climáticos e poluição (de todo tipo) são, pesa reconhecer, as consequências mais visíveis de todo esse desajuste aqui mencionado.

Portanto, na realidade, não tem como ser diferente. Daí em diante, para falar de modo convencional, nada mais lícito do que afirmar que a mudança climática (cada vez mais chamada de emergência climática pelos especialistas e intensificada em uma escala nunca vista), que está longe de terminar, ameaça de vez o futuro do planeta.

Gilberto Natalini é médico-cirurgião, vereador por cinco mandatos na Câmara Municipal de São Paulo. Foi secretário municipal do Verde e do Meio Ambiente (2017) e candidato a governador do Estado de São Paulo pelo Partido Verde (PV) em 2014.

Marcus Eduardo de Oliveira é economista e ativista ambiental. Delegado do CORECON-SP por Osasco. Autor de “A civilização em risco” (Jaguatirica, 2024), entre outros. prof.marcuseduardo@bol.com.br

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