Desde o momento em que escrevi e publiquei artigo anterior, com o título Soberania e Tarifaço, não houve mudança na questão do tarifaço de 50%, determinado por Donald Trump para a importação, pelos Estados Unidos, de produtos brasileiros.
Como sempre, os Estados mais afetados serão os mais desenvolvidos, a saber: São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Minas Gerais. Alguma movimentação em busca de negociação e acordo tem se registrado, mas de empresários. Pessoas alheias ao assunto tomaram conhecimento, por exemplo, da colossal produção de mangas na região do Rio São Franciso, destinadas ao mercado exterior, sendo o maior, entre todos os importadores, os EUA. Navio carregado de manga está paralisado no porto, à espera da solução da crise. Se acordo não houver, os prejuízos serão irreparáveis.
Na mesma condição se encontram produtores de autopeças, de calçados, de proteína animal, de madeira, e de tudo quanto aqui é produzido para o rico mercado norte-americano.
As relações entre Estados Unidos e Brasil sempre se caracterizam pela cordialidade. Ser o embaixador em Washington, ou chefe de um dos vários consultados, tem sido a aspiração máxima de diplomatas do Ministério das Relações Exteriores.
O jornal O Estado, edição de 19/7, na capa do caderno Economia & Negócios, traz matéria com o título: Para ministério, retaliação afetaria importador e consumidor do Brasil. O Ministério a que se refere é o do Desenvolvimento. Indústria, Comércio e Serviços (Mdic), comandado pelo vice-presidente Geraldo Alckmin, político afeito ao diálogo.
Devo reconhecer, entretanto, que nos últimos dias as relações entre o Brasil e os Estados Unidos têm se deteriorado de forma acelerada. Como reação às medidas coercitivas determinadas contra Jair Bolsonaro, o Secretário de Estado dos Estados Unidos, Marco Rúbio, revogou o visto de entrada do ministro do STF Alexandre Moraes, dos demais integrantes do Tribunal e de familiares (O Estado, 19/7, pág. A11).
Deixemos de lado assunto controvertido, para tratar de matéria que nos diz respeito diretamente. Em Sertãozinho, o grupo econômico Raizen ordenou a suspensão por tempo indeterminado das operações da Usina Santa Elisa, produtora de açúcar e de metanol. Foram desligados cerca de 2 mil empregados, moradores dos municípios de Pontal, Barrinha e Pitangueiras.
A demissão de 2 mil empregados, mesmo com os direitos trabalhistas preservados durante algum tempo, afeta, também, empregados indiretos, comerciantes e municípios vizinhos. Enfim, trata-se de problema com profundas repercussões, que deve ser examinado pelos especialistas de direito do trabalho, pois demonstra a relatividade das normas garantidoras do emprego, quando uma crise atinge as estruturas do empregador, exigindo paralisação definitiva das atividades. Para os demitidos, até encontrarem nova colocação, a redução da jornada será total, e deverão se contentar, durante alguns meses, com o seguro-desemprego. Contra empresa que fecha, o recurso à greve é absolutamente inútil.
A Usina Santa Elisa deveria ter mais ou menos quase um século de vida. Durante largo período pertenceu à família Maurílio Biaggi, cuja preocupação com a questão social era conhecida, e eu mesmo testemunhei na condição de Secretário de Estado do Trabalho, no governo Franco Montoro.
Em Capivari, minha terra natal, acompanhei o fechamento de usinas de açúcar pertencentes às famílias Forti, Annichino, De Cillo. Em Araraquara presenciei o encerramento das atividades da modelar Usina Tamoio. Nada, porém, comparável ao que acontece com a Usina Santa Elisa, uma das maiores do Estado de São Paulo e do Brasil.
Um fato de dimensões internacionais desafia a soberania nacional, o tarifaço de Trump, e um acontecimento de repercussão intermunicipal, o encerramento das atividades da colossal usina Santa Elisa, confirma a falibilidade de previsões em política e economia.
Como diria Raymond Aron, caminhamos para o futuro recuando.