Todos os regimes e governos, por mais sanguinários e opressores que sejam, se auto-proclamam “democracias”, sem enrubescer.
Isso se explica pelo temor das turbas, consideradas “insanas” por alguns deles.
Ter essas turbas sob o chicote, ou pelo menos no cabresto, é a garantia da perenidade no poder, mas gera tensões e riscos.
Melhor do que isso é enganar, iludir, prometer, postergar, deixando o povo cativo e eternamente esperançoso.
Na Grécia antiga os governantes eram apenas executores das decisões populares, essas tomadas por maiorias em praça pública, diretamente.
Mas com o aumento das cidades e nações, esse método ficou impraticável e foi substituído pela democracia “representativa”, delegando-se a alguns o poder de decidir as questões comezinhas.
Entretanto, os “representantes” passaram a se acreditar donos da coisa pública, e das comezinhas se arvoraram a decidir tudo, incluindo as regras e até os estatutos sociais.
Nos últimos anos, com o tremendo avanço da tecnologia, tornou-se possível, com celulares (que todos possuem) e suas senhas, o povo retornar à praça e retomar o conceito original da Grécia antiga.
Se for honesto o brocardo de que “todo o poder emana do povo”, por que não praticá-lo ?
Alguém contestaria, afirmando que “falta educação” ou que o povo “não sabe” o que é melhor para ele. Será ?
Esse é o ponto crucial deste modesto artigo.
Democracia é apenas realizar eleições e escolher representantes, que depois fazem somente o que lhes apetece ?
Ou democracia é apenas um bom ditador que distribui benesses e promove o bem-estar coletivo ?
OK vamos à democracia direta. Mas há decisões estruturais a serem tomadas frequentemente. Como realizar tantas consultas populares e plebiscitos ?
Os países socialmente mais avançados já encontraram o ponto de equilíbrio, com resultados tão positivos que nem se notam, já que incorporados naqueles culturas.
Tomemos a Suíça como exemplo, o país pacífico por excelência, com um dos melhores IDH – Índice de Desenvolvimento Humano e o maior PIB – Produto Interno Bruto per capita do planeta.
O regime é bicameral parlamentarista, com eleições de representantes a cada 4 anos e o mais intenso sistema democrático direto do mundo, com vários referendos e plebiscitos todos os anos, regionais e nacionais, em que as questões relevantes, desde programas de governo até mudanças na constituição são decididos livre e soberanamente.
Na Suíça o povo realmente governa, sem traumas e sem atropelos, e hipoteticamente, se o povo se arrepender de alguma decisão anterior, em plebiscito, basta promover novo plebiscito.
Outra questão interligada: por que nos EUA – Estados Unidos da América, outra grande nação, o voto ainda é em papel e não eletrônico ?
Observe-se que a celeuma hoje instaurada no Brasil é apenas pelo voto eletrônico auditável; ninguém duvida de que ele seja melhor do que o antigo voto em papel.
O que quase não se fala, explicando o voto americano em papel, é que lá, além da eleição de representantes, no mesmo dia e na mesma cédula, o povo decide importantes temas em plebiscitos.
Finalizando, solução existe: a democracia direta.
Mas os nossos ditadores, corruptos e demagogos, não querem que seja implantada.
“E la nave va”, como tristemente lembrou Fellini.
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José Crespo foi deputado estadual na ALESP por três legislaturas e atualmente preside o ICPP – Instituto de Cidadania e Políticas Públicas.