Velho e novo sempre foram unidos por estranhas relações acerca da tênue existência humana – mudanças, de quaisquer naturezas são os marcadores dessa linha do tempo. As pessoas só percebem essa realidade quando se dão conta que jovens amigos deixaram de frequentar os campinhos da várzea cada vez mais raros e as conversas mudam de tom e voz ( quando se torna adulto até a voz muda…). Os interesses são outros e cada qual procura ouvir seu coração ou seguir o seu destino. Outros meios para verificar essa mudança são as esquinas vazias, antes frequentadas pela rapaziada do bairro para falar de futebol, de namoricos da escola ou peraltices diversas. Esses são outros sinais evidentes de novos tempos. Além da memória, que com o tempo (sempre o tempo…) vai se empanando, outro arquivo de lembranças que teima, com sucesso, manter os momentos do passado são filmes e fotografias. A bem da verdade, esses meios também estão mudando tecnologicamente. É a vida!
O Estádio Municipal do Pacaembu, chamado com justiça de Estádio Paulo Machado de Carvalho, chefe da delegação da Seleção Brasileira que, em 1958, trouxe para o Brasil o Taça Jules Rimet, além de outros feitos em favor dos esportes é o tema desta coluna. Não existe garoto que nascido pelos idos dos anos de 1950 em diante não tenha, um dia, frequentado o Pacaembu para assistir a uma partida de futebol. Até cerca de uns 10 anos passados, circulando pelos túneis que dão acesso ao gramado, os mais atentos eram capazes de ouvir as chuteiras batendo firmes no chão de cimento e as conversas entre os maiores craques que o Brasil já conheceu, antes de começar a partida – esses túneis não revelarão seus segredos a ferramentas como picaretas e pás, que estripam seus interiores. Antes dessa fase de pás e picaretas, contrariamente, tive essa experiencia e jamais a esquecerei. Circulei lá. Na entrada do gramado, sempre bem cuidado, olhando para as arquibancadas, mesmo estando vazias, ainda se ouvia, com a alma, os gritos e indisfarçadas sensações de emoção das torcidas gritando, batendo bumbo, fazendo o ambiente estremecer.
O Paulo Machado de Carvalho foi assim, com alguns intervalos por ingerência política, durante quase oito décadas. Agora, no entanto, a mudança chegou forte. Embora seja patrimônio tombado pela cultura paulista, todo o complexo esportivo vem sofrendo reformas profundas. Àquele pedaço da cidade, que atraia a atenção de milhões de pessoas foi concedido para o grupo financeiro Mercado Livre, por meio da empresa de engenharia Allegra Pacaembu. A intenção dos investidores não é diferente. Querem a “casa cheia”, mas para demais finalidades, tais como restaurantes, reuniões de negócios, entretenimentos, inclusive futebol. O objetivo é maximizar ganhos e dar um tom de evolução para São Paulo. Os novos visitantes, sobretudo os mais jovens, saberão a história real do velho Estádio somente em museus, fotos e recortes de jornais. Algumas marcas do antigo estádio ficarão lá, dissimuladas em vários ambientes, entre eles o nome. Isso, porque o nome adotado de agora em diante será “Mercado Livre Arena Pacaembu”, assim como em outros locais alguma impressão digital do antigo Pacaembu será mantida. Quando terminar, se terminar, essas obras transformadoras da engenharia estarão apagando uma luz, aquela do passado, e acedendo outra, a do futuro..
Antoninho Rossini – Jornalista e Escritor