O Supremo Tribunal Federal pautou para 17 de abril o início do julgamento do Recurso Extraordinário n⁰ 1.133.118, no qual se discute a constitucionalidade de lei do município de Tupã, interior de São Paulo, que permitiu a nomeação de parentes do prefeito, vice-prefeito, vereadores e outras autoridades de alto escalão, para o cargo de secretário municipal, à luz da vedação à prática do nepotismo.
Antes de tudo, cumpre esclarecer que nepotismo é a prática de favorecimento dos vínculos de parentesco em relações de trabalho ou emprego. Na maioria das vezes, o nepotismo acontece quando um gestor nomeia um parente seu para um cargo apenas pelo fato de que são da mesma família.
Essa prática é muito discutida no âmbito da Administração Pública, como no caso das prefeituras, sobretudo porque o setor público segue os princípios da moralidade e da impessoalidade, previstos no artigo 37 da Constituição Federal, que objetivam evitar que o administrador aja como se fosse dono daquilo que é de todos.
No longínquo ano de 2008, o STF editou a súmula nº 13, a qual diz que a nomeação de cônjuge, companheiro ou parente, até terceiro grau, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo de comissão, de confiança ou de função gratificada em qualquer dos poderes da república, viola a Constituição Federal por se tratar de prática de nepotismo.
Acontece que essa súmula deixou de fora os cargos políticos, diferentes dos demais por não terem função estritamente administrativa, servindo para dar força política ao governo e exercer a soberania do órgão público. Exemplos de cargos políticos são aqueles de secretário municipal, já citado, e de Ministro de Estado.
Como não estava expressamente proibido, alguns entendiam que podiam e outros que não, o que gera grande insegurança jurídica.
Foi com essa conjuntura de indefinição que o município de Tupã elaborou a Lei 4.627/2013, permitindo a nomeação de parentes para o cargo de secretário municipal. Na visão do município, os ocupantes de cargos políticos são nomeados em razão de uma relação de proximidade com quem os nomeia, como o prefeito, por exemplo. Em razão de a confiança ser um atributo inerente a quem ocupa esse cargo, a nomeação precisa ser livre e cabe ao gestor indicar quem quiser, mesmo que seja seu parente.
O Ministério Público do Estado de São Paulo, por entender que o favorecimento do familiar subsiste mesmo em caso de nomeação para cargo político, ingressou com ação para declarar a inconstitucionalidade da norma, sustentando que ela viola os princípios da Administração Pública previstos no artigo 111 da Constituição Estadual, com correspondente quase idêntico no já citado artigo 37 da Constituição da República. O Tribunal de Justiça Paulista entendeu do mesmo jeito e acatou o pedido para declarar inconstitucional a norma do município, que se socorreu no Supremo e aguarda julgamento.
O que parece mais adequado para evitar que o judiciário invada a esfera de atuação do executivo, a quem deve mesmo competir a escolha da nomeação, mas tampouco deixar de lado a moralidade e impessoalidade administrativas, é que sejam colocadas algumas balizas para a nomeação do familiar. Nem tanto ao céu, nem tanto ao mar.
Apesar de ainda não ter dado nenhuma decisão clara e definitiva sobre o assunto, o STF, em decisões mais recentes (RCL 34.413 AgR e RCL 22.339, ambos de 2019), chegou a fixar alguns requisitos objetivos para a nomeação. Entre eles, é possível citar a necessidade de que exista certa compatibilidade entre a formação do nomeado e o cargo ocupado, de modo que se o parente não tiver a mínima competência para o cargo, essa nomeação será considerada como afrontosa a regra da vedação ao nepotismo.
Esse posicionamento deve ser confirmado no caso aqui tratado, no qual o STF reconheceu a repercussão geral do recurso de Tupã (tema 1000) ante as inúmeras ações sobre a mesma questão e a insegurança jurídica a esse respeito, o que significa que sua decisão, agora, deve colocar um fim a discussão do ponto de vista jurídico, mas nada leva a crer que quaisquer dos lados vai se conformar com a decisão, seja ela qual for.