A democracia brasileira precisa ser defendida por todos nós. E sempre, pois não se pode subestimar o poder e a insistência de seus inimigos para derrubá-la.
Pesquisa da Fundação Getúlio Vargas dá conta que, além de 95% dos brasileiros acreditarem que a Justiça é lenta, 61% não acreditam na própria Justiça, posto que a consideram muito politizada.
Pode não parecer, mas esses são indicativos perigosos, posto que é a Justiça aquela que tem total e principal responsabilidade pela ‘guarda’ da Constituição, a lei maior de uma nação. Como escreveu o jornalista Bruno Soller (Estadão de 27.11.23 – “Brasileiro não acredita na Justiça, que é vista como lenta e politizada”), essa insatisfação, com relação à “base mais importante da fundamentação do ordenamento republicano” é preocupante.
Preocupante e grave, sem dúvida, porque dentre as muitas e diversas consequências, essa “insatisfação com a Justiça” tem se traduzido, ao longo do tempo, e não só no Brasil, como uma descrença na própria Democracia.
Está claro que sistemas presidencialistas, como o vigente no Brasil, que dá muito poder ao presidente da República, foi constantemente exigindo, como justa e correta contrapartida, que se estabelecesse um conjunto suficiente, de ‘pesos e contrapesos’, para manter a desejada independência entre os poderes e, mais do que isso, o equilíbrio entre eles. Não à toa é que a Constituição Brasileira, promulgada em 1988, delegou ao Poder Judiciário, e sempre de forma republicana e democrática, poderes de controle. E como não poderia ser diferente, agradando alguns e desagradando outros.
Acredito que também não há qualquer dúvida que, em face do aumento do protagonismo do Poder Judiciário, aqui no Brasil, nos últimos dez ou quinze anos, os demais poderes, notadamente o Legislativo, imperceptível para a maioria da população, mas de forma constante, foi ‘engrossando’ o grupo dos ‘descontentes’.
Infelizmente, e isso pouco é comentado, a não ser por especialistas profissionalmente honestos, esse aumento de protagonismo, via a instalação de um processo de transferência de mais poderes para o Poder Judiciário, em especial ao STF no caso do Brasil, deu-se pela própria atuação dos Partidos Políticos, posto que foram, e ainda são, aqueles “que mais demandam a intervenção do Supremo em questões políticas, morais e econômicas”, como bem explicou o professor Oscar Vilhena em seu artigo para o site da Exame (1). Segundo ele, “a politização do Supremo é em grande medida decorrente da incapacidade do sistema político de resolver os seus problemas (grifos meus), que terminam transbordando para o sistema de justiça. Isso não significa que não haja ministros que avancem o sinal, buscando impor suas decisões sobre o plenário e mesmo sobre os demais poderes. E isso deve ser corrigido. Mas o que precisamos, para que se combata eventuais excessos do judiciário, é “aumentar a colegialidade, reduzir o protagonismo individual e produzir decisões mais consistentes”. Perfeito!
Segundo o artigo “Coleira forte para cachorro grande”, publicado também no último dia 27 (Estadão), pelo professor Carlos Pereira (Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da FGV), foi o próprio Supremo Tribunal Federal (STF), ainda sob liderança da ministra Rosa Weber, que ao ter plena consciência desse ‘aumento de protagonismo’, buscou instrumentos para “se autoconter”. Para tanto foi elaborada importante reforma no regimento interno do STF, no qual ficou estabelecido que, além de “prazos mais rígidos para a apreciação de pedidos de vista”, as “decisões monocráticas poderiam ser apreciadas imediatamente pelos colegiados”.
Paralelamente, e como não se esperava, a não ser pelo fato de que o presidente do Senado, senador Rodrigo Pacheco, quer se viabilizar como candidato ao governo de Minas Gerais via eleitores da ‘direita’ e que se identificam com uma atuação mais branda da Justiça, em especial do STF, o Senado Federal, ignorando tal iniciativa do Supremo, e ‘vasculhando’ seus arquivos, foi buscar, para aprovar de forma muito mais rápida que o normal, a PEC 8/2021 (2), cujo objetivo principal é o de restringir atuações do Supremo, posto que proíbe que Ministros do STF “tomem decisões monocráticas para suspender a eficácia de leis e atos dos presidentes da República, do Congresso, do Senado e da Câmara dos Deputados”. Decisões monocráticas, portanto, somente poderiam ser tomadas pelo Presidente do STF, “em períodos de recesso e em situações de grave urgência ou perigo de dano irreparável”. A PEC está, agora, em discussão na Câmara dos Deputados.
Sem que nos aprofundemos na análise dessa PEC, principalmente no que diz respeito aos seus aspectos jurídicos e de legalidade, está claro que se trata de uma intervenção direta na atuação do Judiciário, pois de uma forma ou de outra, a agilidade da Corte será comprometida. Esse ‘enfraquecimento’ do STF, e ainda de acordo com o professor Pereira, deverá estimular que se proponham novas alterações, sempre com o objetivo de se diminuir “os poderes individuais de seus ministros”, bem como “os poderes da própria Suprema Corte”. E conclui o professor Carlos Pereira: “parece que esse é o preço que o Legislativo decidiu pagar, pelo menos até o momento”, para ter quem controlasse os demais poderes.
Como se sabe, autoritarismo e justiça são valores que se opõem um ao outro, pois regimes autoritários apenas “se utilizam” do poder judiciário para demonstrar um pouco de ‘civilidade’. O poder judiciário, nesses regimes, são instituições ‘faz de conta’ cuja única finalidade é dar uma certa aparência democrática ou de legalidade aonde, de fato, elas não existem.
Para tanto, e agora me socorro do que escreveu o professor de Direito Constitucional da Faculdade de Direito da USP, Conrado H. Mendes (3) “seja por cooptação de uma magistratura venal, seja pela exclusão de dissidentes e supressão da independência, um Poder Judiciário domesticado presta serviços indispensáveis ao autoritarismo”. “Juízes dóceis ajudam a coordenar ações e emprestam uma estampa de legalidade à violência. São parceiros no projeto de ataque às liberdades”. “Um Judiciário de apologistas se constrói tirando quem não agrada e colocando quem, por instinto ou convicção, prefere rezar a cartilha do regime à da legalidade”.
E são diversos os exemplos citados pelo professor Mendes. Getúlio Vargas, a ditadura militar e, mais recentemente, os generais Villas Bôas e Girão Monteiro, aqui no Brasil, Chaves e Maduro, na Venezuela, Orban, na Hungria, o governo do partido Legalidade e Justiça, na Polônia etc., ilustram o que, de fato tem acontecido (4). Todos são contra quaisquer medidas de ‘pesos-e-contrapesos’ que possam, direta ou indiretamente, submeter seus governos e autoridades a algum tipo de controle.
- Por outro lado, no famoso livro “Como as Democracias morrem” (Zahar, 2018), Steven Levitsky e Daniel Ziblatt escreveram que “para os outsiders, porém, sobretudo aqueles com inclinações demagógicas, a política democrática é com frequência considerada insuportavelmente frustrante. Para eles, freios e contrapesos são vistos como uma camisa de força” (grifos meus).
Constata-se, portanto, e isso vale para qualquer sociedade democrática do mundo atual, que maiores serão os riscos de se instalar um regime autocrático, quanto maior for o desrespeito à justiça e a sua Suprema Corte. Aliás, é isso que os segmentos mais radicais da política, seja de esquerda ou de direita, vem ‘praticando’ em todo o mundo. A crítica e a narrativa negativa, que se faz aqui no Brasil, neste caso pela extrema direita, não tem outro objetivo a não ser intimidar e enfraquecer o judiciário para mantê-lo, se possível e o quanto puder, subserviente.
Esse risco, para ser minimizado e ao contrário do que muitos dizem e defendem, exigirá um Judiciário que, dentro de seus limites constitucionais, seja corajoso, proativo (não ativista) e que haja com rapidez, na defesa da Constituição e de tudo o que ela representa. No caso brasileiro, que possui uma Constituição muito bem-feita, defendendo a Democracia e o Estado de Direito, valores inegociáveis e que fazem parte do que se pode chamar de a principal de todas as cláusulas pétreas.
Portanto, é preciso muito cuidado, pois como já esclareceram Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, em livro aqui citado, “a investida contra a democracia começa lentamente” e de forma imperceptível para a maioria da sociedade, pois, entre outras características, as “eleições continuam a ser realizadas”, os “políticos de oposição ainda têm seus assentos no Congresso” e os “jornais independentes ainda circulam”. Na verdade, são dados pequenos passos, até certo ponto “insignificantes”, já que individualmente “nenhum deles aparenta de fato ameaçar a democracia”. Com um judiciário e um legislativo ‘dóceis’, existe todo um “verniz de legalidade”. Até porque, sempre que possível, são providências tomadas “sob o pretexto de diligenciar algum objetivo público legítimo – e mesmo elogiável – como combater a corrupção, limpar as eleições, aperfeiçoar a qualidade da democracia ou aumentar a segurança nacional”.
É óbvio, consequentemente, que candidatos a ditadores não gostam dos poderes judiciários e/ou policiais independentes, na medida em que podem denunciar transgressões ou ilegalidades dos infratores de plantão. Muito pelo contrário, como aqui já vimos, pois quando cooptadas as forças judiciais e/ou policiais, não importando a forma, as investigações podem ser suspensas ou arquivadas e é possível “sentar em cima” dos processos etc. etc. Mantê-los impunes é o grande objetivo. Ainda, como escreveram Levitsky e Ziblatt, “com forças policiais rendidas, os governos podem agir com impunidade” e a “captura de ‘juízes’ dá ao governo mais que um escudo, pois também oferece uma arma poderosa, permitindo que ele imponha a lei de maneira seletiva, punindo oponentes e favorecendo aliados”. Impeachment, na verdade, somente para “juízes incorruptíveis”.
É muito comum nos sistemas autoritários, por exemplo, como forma de aumentar seu poder e os seus níveis de proteção, providências específicas para diminuir o protagonismo e a influência dos demais poderes, bem como da oposição. Para tanto, alteram o sistema eleitoral, modificam objetivos de determinadas instituições ou as estinguem, mudam a composição das Cortes de Justiça, em suas várias instâncias e, se puderem, “reformam” a Constituição. São, quase sempre, providências que estão fora das leis vigentes e que ferem a própria Constituição do país, mas que, com a concordância do judiciário – cooptado – parecem legais.
Geralmente, ainda como explicitado por Levitsky e Ziblatt, esses “aspirantes a autocratas costumam usar crises econômicas, desastres naturais e, sobretudo, ameaças à segurança – guerras, insurreições armadas ou ataques terroristas – para justificar medidas antidemocráticas”. O que ocorreu após o 11 de setembro, nos EUA, e a guerra das Malvinas, na Argentina, são exemplos.
Vale lembrar que um dos problemas de difícil solução, entretanto, é o fato que “os cidadãos também se mostram mais propensos a tolerar – e mesmo a apoiar – medidas autoritárias durante crises de segurança, sobretudo quando temem pelo seu bem-estar!”
De qualquer forma, vale repetir o que escreveram Levitsky e Ziblatt, que mesmo as constituições mais bem elaboradas, com “pesos e contrapesos” bem definidos e caracterizados, não há como garantir a democracia, posto que:
- “1º) as constituições não são completas e sempre tem inúmeras lacunas e ambiguidades, sendo incapaz de antecipar todas as contingências possíveis ou prescrever como se comportar sob todas as circunstâncias;
2º) as regras constitucionais também estão sempre sujeitas a interpretações conflitantes e se os poderes constitucionais estão abertos a múltiplas leituras, eles podem ser usados de maneiras que seus criadores não anteciparam;
3º) as palavras escritas de uma Constituições podem ser seguidas ao pé-da-letra de forma a enfraquecer o espírito da lei”.
Tenho claro, consequentemente, que há em andamento, um processo de agressão ao STF brasileiro, pois queira-se ou não, durante os últimos 15 anos foi ele um dos poderes que mais contribuiu para manter em ‘pleno’ funcionamento o Regime Democrático e o Estado de Direito, tais como estabelecido pela Constituição de 1988. Principalmente no período do (des)governo Bolsonaro, que ignorou, por todo o seu mandato, os demais poderes constituídos. Parece-me evidente, portanto, que a PEC 08/2021 foi uma forma de “retaliação” do Senado, liderado por Pacheco e Alcolumbre que, representando uma classe política – de esquerda, centro e direita – incomodada com o protagonismo do STF no cenário nacional, ainda não conseguiu ‘digerir’ os limites constitucionais defendidos pela Corte Suprema. Ressalte-se, mais uma vez, que a extrema direita jamais aceitou o papel do STF na defesa da Democracia por todo o período do governo anterior. Daí que a defesa feita pelo presidente do STF, Ministro Barroso, foi importante e muito clara. Permito-me, aqui, transcrever um pequeno trecho: “Não há institucionalidade que resista se cada setor que se sentir contrariado por decisões do tribunal quiser mudar a estrutura e funcionamento da Corte”. “Não se sacrificam instituições no altar das conveniências políticas”. “O STF não vê razão para mudanças constitucionais que visem a alterar as regras do seu funcionamento”. E, importantíssimo: “num país que tem demandas importantes e urgentes, que vão do avanço do crime organizado à mudança climática, que impactam a vida de milhões de pessoas, nada sugere que os problemas prioritários do Brasil estejam no STF”. Com certeza não estão! |
No dia 26 pp, no Estadão, o tradutor e ensaísta Luiz Sérgio Henriques escreveu um artigo interessante (“A paz imprevisível”) ao retratar aspectos importantes da guerra Israel Hamas. Ao comentar sobre Benjamin Netanyahu, escreveu ele: “as democracias permanecem assediadas internamente por atores disruptivos com capacidade para produzir fissuras em consolidadas tradições constitucionais. E, por ironia, nem mesmo a democracia israelense está livre deste assédio”. “Um político como Benjamin Netanyahu, não por acaso, é fator interno de restrição das liberdades e fator externo de guerras e invasões, ainda que nesta última circunstância tenha os extremistas palestinos como sócios dedicados”. “Netanyahu é a manifestação israelense deste movimento reacionário global. Antes de 7 de outubro, havia um número impressionante de cidadãos nas ruas e praças de Israel, em manifestações que perduraram por meses a fio em defesa do Poder Judiciário. Por certo, a esquerda em sentido estrito, minoritária desde que a perspectiva de paz se enfraquecera, não tinha o controle dos protestos, dominados por preocupações com o destino de uma instituição absolutamente decisiva. E neles não estavam os árabes israelenses. Não importa muito, brotava ali o germe da renovação e da esperança, o repúdio de massas contra o autocrata em formação (grifos meus). Em resumo, alguns analistas acreditam que o Senado tenta dificultar o que ele entende como poder “sem limites” dos ministros do STF, outros acreditam em “jogo de cena”, uma vez que o Senador Rodrigo Pacheco está buscando apoio à sua candidatura junto ao eleitorado bolsonarista. Como explicou o ex-ministro Miguel Reali Jr., essa emenda não terá efeito algum (5), já que “na verdade é apenas um jogo político que desmerece o Congresso, pois estabelece um confronto público com o Judiciário. É isso o que aparenta e o que os bolsonaristas querem”. De qualquer forma é preciso estar atento, pois acredito que a extrema direita trabalha, e há muito tempo, no sentido de diminuir a importância do Poder Judiciário, considerando ser essa a única forma de se fazer o que se quer, independentemente da Constituição em vigência, ou se fazer alguma coisa com aparência de legalidade. Vigilância sempre, pois Democracia e Estado de Direito não se alinham e esse modelo e muito menos aos reais desejos da grande maioria da população brasileira. Site da Exame de 27/11/23 (“Limites do Poder: Oscar Vilhena discute a PEC 08/2021 e o futuro da justiça constitucional no Brasil”);A PEC altera a Constituição Federal e dispõe sobre os pedidos de vista, declaração de inconstitucionalidade e concessão de medidas cautelares nos tribunais. Além do que estabelece prazos para os pedidos de vista nos julgamentos colegiados do Poder Judiciário, determina que somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial os tribunais possam deferir medidas cautelares que suspendam a eficácia de leis e atos normativos, suspendam atos dos presidentes dos demais poderes, suspendam a tramitação de proposições legislativas, afetem políticas públicas ou criem despesas para os demais poderes. “A política do pânico e circo” é um dos ensaios publicados no livro “Democracia em Risco? – 11 Ensaios sobre o Brasil hoje” (Cia. Das Letras, 2019). Nesse ensaio, o professor Conrado Hübner Mendes, de direito constitucional da Faculdade de Direito da USP e doutor em direito pela Universidade de Edimburgo e doutor em ciência política pela USP, deixa claro ao afirmar que “Regimes autoritários não abrem mão da servilidade judicial”. “Como as Democracias morrem”, de Steven Levitsky e Daniel Ziblatt (Zahar, 2018). “Quando Perón assumiu a presidência em 1946, quatro dos cinco membros da Suprema Corte da Argentina eram oponentes conservadores, um dos quais o chamara de fascista”. “Os aliados de Perón no Congresso afastaram três dos magistrados, com base em acusações de conduta ilegal (e um quarto membro renunciou antes que viesse a sofrer impeachment). Perón nomeou então, quatro sectários e a corte nunca mais lhe fez oposição”. O mesmo ocorreu com três dos sete magistrados do supremo no Perú em 1997 que, afastados de seus cargos por seus aliados no Congresso, permitiram a Fujimori contornar os limites constitucionais de mandato. Alegação? Os três juízes haviam “infringido a Constituição”. Na Hungria, o governo Orbán aumentou o número total de membros da Corte Constitucional, mudou as regras de nomeação e encheu a corte de partidários. Além disso o partido governante (Fidesz) se valeu da maioria no parlamento para “reescrever a Constituição e as leis eleitorais de modo a consolidar suas vantagens”. Na Polônia o Partido da Lei e da Justiça, governante, teve várias de suas iniciativas bloqueadas pelo Tribunal Constitucional – a mais alta autoridade do país em questões constitucionais – entre 2005 e 2007. Na volta ao poder, em 2015, numa manobra constitucional dúbia, o novo governo da Lei e Justiça impôs cinco novos juízes. “Em 1999 o governo Chaves convocou eleições para uma Assembleia Constituinte que, violando uma decisão anterior da Suprema Corte, concedeu a si mesma o direito de dissolver todas as demais instituições do Estado, inclusive a Suprema Corte”. “Temendo pela própria sobrevivência, a Suprema Corte aquiesceu e decretou que a iniciativa era constitucional”. O Supremo já decidiu no passado – durante o plano Collor – que nenhuma lesão ou ameaça a direito poderá deixar de ser apreciada pelo Judiciário, em plena conformidade com o inciso XXXV, artigo 5º. Da CF. A obtenção de uma cautelar quando houver risco de lesão irreparável do direito, em face da demora na apreciação de um ato ou lei, é parte do direito fundamental de acesso à Justiça. Assim, toda forma de embaraçar o acesso à Justiça é uma violação de uma cláusula pétrea da Constituição. Nesse sentido o Supremo poderá sim declarar a inconstitucionalidade de uma eventual emenda restritiva dos direitos fundamentais. Não creio, no entanto, que isso será necessário, pois deverá prevalecer no final dessa refrega o que foi estabelecido pelo Regimento. Temos que restringir as decisões monocráticas ao máximo, sem que isso, no entanto, iniba a devida proteção de direitos. E isso já foi equacionado pelo Regimento do Supremo. “Jogo de cena para bolsonarista ver” é o título do artigo publicado pelo jurista e ex-ministro Miguel Reale Jr. (Estadão de 02/12/23): “Ao ressuscitar esta emenda constitucional, era perceptível a intenção do Legislativo de ditar regras sobre o funcionamento do STF e de estabelecer a supremacia do Congresso. Essa intencionalidade ficou patente ao aprovar o projeto de emenda desidratado, limitado tão somente a proibir decisão monocrática liminar em Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), matéria já versada no artigo 10 da Lei n.º 9.868/1999 e na Emenda Regimental 58/2022. Esta PEC é, portanto, tão somente um aceno da presidência do Senado aos senadores e mineiros bolsonaristas. |
Gostei.