Home / Opinião / A COP-30 deles e a Vila Sônia nossa – por Almir Pazzianotto

A COP-30 deles e a Vila Sônia nossa – por Almir Pazzianotto

Enquanto em Belém delegações de mais de 150 países gastam tempo e dinheiro em tentativa heroica de salvar o planeta, em São Paulo o homem prossegue em sádico esforço de destruição da natureza, com o objetivo único de ganhar dinheiro.

Não desejo ser melodramático. Os fatos, porém, exigem que me manifeste sobre gritante contradição entre utopia e realidade. Em Belém uma das metas é deter o desmatamento da Amazônia Legal, área que engloba oito dos nossos estados: Acre, Amapá, Amazonas, norte do Mato Grosso, Pará, Roraima, Rondônia, Tocantins, parte do Maranhão, perfazendo área de 5.015 milhões de quilômetros quadrados, ou cerca de 59% do território, onde vivem aproximadamente 23 milhões de pessoas distribuídos em 775 municípios, das quais 250 mil representam 80 etnias indígenas.

O município de São Paulo, capital do Estado, possui apenas 1.521 km2. É uma das cidades mais populosas do mundo, com 11,5 milhões de habitantes e densidade populacional de 7.6 mil moradores por quilômetro quadrado.

 As áreas desmatadas da Amazônia “aumentaram em 91% no mês de maio, de acordo com dados do Instituto Nacional de Pesquisas Especiais (Inpe). O resultado é o 2º pior da série histórica para o mês, com 960 km2 de área desmatada, contra 504 km2 em maio de 2024”. Os dados foram retirados da Wikipédia, relativos ao dia 19/11/2025.

Enquanto nos preocupamos com o desmatamento da Amazônia, ignoramos o que se passa em São Paulo, cujo reduzido território, sobretudo em alguns dos distritos, padece de ausência de arborização e de espaços livres, impondo pesados sofrimentos a milhões de famílias, sobretudo às crianças.

Os jornais do dia 18 trazem péssima notícia. A administração municipal aprovou o corte de 384 árvores na Vila Sônia, distrito situado na zona oeste, subprefeitura do Butantã, para abrir espaço à construção de condomínio com quatro torres de nove andares e 708 apartamentos de 30 m2.

A matéria diz que, a título de reparação, a construtora comprometeu-se a plantar 222 mudas de espécies nativas no terreno ou nos arredores dos imóveis. A justificativa adotada pela construtora é falsa, artificial, hipócrita. Plantar mudas “no terreno ou nos arredores do imóvel” nada significa. O que diz a expressão “arredores”? As mudas vingarão? Quantas décadas serão necessárias para restabelecer algo semelhante à mata original, isto se as mudas não perecerem e prosperarem?

Moradores da Vila Sônia qualificam a derrubada das árvores nativas como devastação. Vou além. Trata-se de crime contra o meio ambiente, em uma cidade que sofre cotidianamente com a poluição da atmosfera e, periodicamente, com inundações causadas pela impermeabilização do solo. A derrubada de 384 árvores, muitas centenárias, além dos prejuízo\ b   c b /os aos moradores, atingirá a fauna local constituída por pássaros de variadas espécies, como sabiás, sanhaços, periquitos e tucanos, e macacos, micos e saruês (O Estado, 18/11, pág.A16).

A prefeitura municipal se defende. Alega que as construções se destinam à população de baixa renda, com ganhos familiares de até 6 salários-mínimos. Não haveria, porém, outro local dentro do município ou na Região Metropolitana? Prédios semelhantes poderiam significar o esforço de urbanização de favelas, como a do Real Parque, com aproximadamente 47.300 m2, ou Paraisópolis, que abriga população de aproximadamente 100 mil habitantes.

A devastação da região Amazônica é realidade impossível de ignorar e de conter. Tentativas retóricas nesse sentido malogram diante da ferocidade com que avança a pecuária sobre áreas desmatadas. O garimpo ilegal é outra atividade que desafia tíbias medidas do governo federal, ante a impassividade de administrações estaduais e municipais.

A COP-30 emitirá vibrantes documentos, incapazes, contudo, por falta de vontade e de dinheiro, de se transformarem em medidas objetivas. Enquanto isso, em São Paulo a prefeitura e a Câmara Municipal continuarão se omitindo ou contribuindo para a destruição daquilo que resta de exemplares da Mata Atlântica e da minguada fauna sobrevivente no município.

…………………………………………………

Advogado. Foi Ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho.

Marcado:

Deixe um Comentário