Após trabalhar e estudar leis penais em nosso país por mais de 25 anos, a impressão que tenho é que “é proibido proibir”. Sempre se tem uma desculpa ou justificativa para abrandar a pena. É a cultura da segunda, terceira ou quarta chance para aquele que insiste em cometer delitos. Matou porque ela o traiu. Ele rouba mas faz, são alguns dos jargões que servem para minimizar a culpa de pessoas suspeitas de atos criminosos.
O exemplo mais claro é o motorista que ingere bebida alcoólica à vontade, e depois, mesmo sabendo que não está em condições normais de dirigir, insiste em pegar o veículo e acaba matando pedestre. Para piorar a situação, ele foge para não ser identificado como autor. Se alguém anotou a placa e é descoberto ou se é detido pela polícia após perseguição, surge a primeira colocação, que já virou moda: “Não parei para socorrer a vítima pois populares queriam me linchar”. O curioso, é que se “esqueceu” de ligar para o 190 e também não se apresentou à delegacia mais próxima. Em seguida, joga-se a responsabilidade para a vítima: “Não pude fazer nada, a idosa atravessou fora da faixa de pedestres”. Por último, temos a discussão se o condutor deve responder por homicídio doloso ou culposo.
O chamado dolo eventual ocorre quando o agente, mesmo não desejando o resultado, assume o risco de produzi-lo. Mas a maioria dos magistrados não pensa assim; assassinos respondem apenas por terem agido com imprudência, imperícia ou negligência, por isso não chegam a cumprir pena na cadeia.
No Pará, motorista dirigia automóvel e falava ao celular. Distraído, atropelou pedestre, que morreu no local. O juiz criminal o condenou por homicídio culposo, com pena brandíssima. O promotor recorreu ao Tribunal Federal Regional, e o juiz-relator, Fernando Tourinho Neto, manifestou-se, dizendo que quem guia falando ao telefone “demonstra o risco assumido de produzir o resultado da morte da vítima”. Todos os desembargadores da 3.ª Turma do TRF seguiram seu voto, entenderam que era caso de homicídio doloso. O processo foi encaminhado para apreciação do Superior Tribunal de Justiça, em Brasília. Enquanto a discussão jurídica segue acalorada, o motorista que atropelou e matou, segue dirigindo tranquilamente, e não duvido que continue falando ao celular. Já os familiares da vítima, continuam a chorar a perda do ente querido e sentindo na pele o peso da impunidade brasileira.
Motorista + Celular e seja o que Deus quiser – por Jorge Lordello








