O Brasil respirou aliviado. Quando já se esperava pelo pior, Donald Trump adotou decisão razoável. Retirou da lista de importados, com pagamento tarifário de 50%, aproximadamente 700 produtos, entre os quais aviões, celulose e suco de laranja. Manteve, entretanto, o café, a carne bovina, frutas e centenas de outros itens. Além disso, adiou para o dia 6 de agosto a entrada em vigor do decreto determinante da sobretaxação, medida que abre espaço para novas negociações.
Na edição de hoje, o comedido jornal O Estado, em editorial da página A3, observa: Poderia ser pior. Com efeito, o presidente Donald Trump poderia se conservar indiferente aos apelos brasileiros, ou reduzir a uma duzia a relação dos importados beneficiados pela exclusão. É recomendável, portanto, que o presidente Lula não insista nas fanfarronadas que se habituou a discursar para a claque que o acompanha e aplaude. Interpreto a decisão do presidente Trump como gesto de boa-vontade que não deve ser desperdiçado.
Ensina Raymond Aron, na Apresentação à 8ª edição francesa de Paz e Guerra entre as nações (Martins Fontes, 2018, IX), que “o sistema econômico (mundial) divide-se entre centro e periferia, ou seja, os países industrializados situam-se no centro e os países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento distribuem-se na periferia. O centro compreende os Estados Unidos e os outros países industrializados, com os primeiros explorando os segundos e todos eles explorando a periferia. Nada impede que se aplique a mesma dualidade ao interior de cada país: os Estados ricos deixam ficar em sua periferia uma pequena parcela do excedente que nela obtiveram”.
A consulta à relação dos produtos industriais, agroindustriais e agrícolas exportados, e o volume das exportações e das importações, revela nossa débil posição, dependente das determinações dos Estados Unidos. Não se trata aqui de pensamento nacionalista do modelo “o petróleo é nosso”, mas de efetiva posição periférica, comprovada pelo PIB e pelo PIB per capita.
A industrialização do Brasil se inicia durante o Estado Novo (1937-1945) e ganha alento durante o mandato do presidente Juscelino Kubitschek, graças, em grande parte, à chegada das empresas produtoras de veículos automotivos e de autopeças, instaladas no ABC. O Anuário Anfavea 2025 traz a radiografia do setor, mostrando a evolução a partir de 1977. Desde então foram produzidos 95,9 milhões de veículos. Uma ameaça, porém, pesa sobre a indústria das indústrias, representada pelo avassalador avanço da produção chinesa, conforme alertou Márcio de Lima Leite no artigo Um País Gigante Precisa de uma Indústria Automotiva Fortalecida (Anuário Anfavea 2025, pág. 12), do qual retiro o seguinte trecho, no qual é nítida velada alusão à China: “Temos um imposto de importação muito baixo para elétricos e híbridos, o menor entre países que fabricam veículos. Isso nos torna um alvo preferencial de empresas importadoras, em prejuízo de nosso parque industrial e dos nossos empregos”.
É normal, legítima e habitual a proteção ao setor industrial interno, e aos empregos por ele gerados, mediante a imposição de impostos, tarifas e de outros recursos similares. Errada está a inexistência de meios legítimos de defesa. Nesse sentido oportuna advertência do presidente da Anfavea, em relação aos veículos híbridos e elétricos trazidos, sobretudo, da voraz e insaciável China comunista.
A batalha em torno de tarifas felizmente foi adiada. Dela, porém, é urgente tirarmos ensinamentos. A primeira é de que devemos estar sempre alertas e preparados para enfrentar situações semelhantes, restabelecendo laços de centenária amizade com os Estados Unidos. A segunda, na diversificação de mercados e de investimentos, para não permanecermos na dependência de um ou dois países.
O presidente Lula, por sua parte, deve vestir o roupão da modéstia, e deixar de acreditar que nas relações exteriores a sua vontade é lei.
Advogado. Foi Ministro do Trabalho e presidente do TST
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