O que restou daquele campo de extermínio nazista será preservado para sempre – como um alerta. Essa verdadeira memória do horror, que emudece os visitantes, jamais será esquecida e ficará como testemunha desse cenário de violência e atrocidades que vitimou milhares de judeus e prisioneiros políticos durante a II Guerra Mundial.
O campo de concentração de Dachau, na Alte Römerstrasse 75, nas proximidades de Munique, no Estado da Baviera, Alemanha, assusta com seu frio e tétrico silêncio. E sempre será lembrado por quem o visitou.
Até hoje, turistas de todo o mundo vão a Dachau. Até hoje sentem aquele ambiente pesado no ar, aquele odor estranho, que parece de algo queimado, e aquele calafrio que provoca arrepios incontroláveis, mesmo após mais de 90 anos do início do Holocausto, da perseguição e morte de judeus na Europa. Algo para jamais ser esquecido.
A minha ida a Dachau ocorreu na véspera da decisão da Copa do Mundo de 1974, quando o Brasil perdeu da Polônia e terminou a competição em quarto lugar. Na manhã do jogo fomos ver esse campo de concentração: eu, Sérgio Barbalho, meu companheiro de Folha de S. Paulo, o repórter Flávio Adauto, e o comentarista Randal Juliano, da Rádio Jovem Pan.
Muros imensos cercam Dachau. Os gigantescos portões de ferro assustam. Abertos, mostram pavilhões – os que sobraram – onde os prisioneiros dormiam e outros espaços gramados, que representam os demais galpões que não existem mais. Ao fundo, uma construção maior que abriga um museu. E, ao lado, os fornos crematórios.
No museu, uniformes listrados que eram usados pelos prisioneiros, pares de óculos, sapatos, malas, dentaduras, roupas de bebês e muitas fotos, tiradas pelos soldados da SS e conservadas pelos aliados que invadiram o local no final da Guerra.
Filmes também são exibidos a cada hora. Mostram as atrocidades da concentração, prisioneiros doentes amontoados nos pavilhões e pilhas de corpos sendo atiradas em gigantescas valas. Também esses filmes foram feitos por soldados nazistas, que gostavam de registrar o que acontecia naquele campo de extermínio. Os militares não conseguiram juntar esses filmes antes da fuga.
Porém o mais assustador e impressionante está reservado para os fornos crematórios, onde milhares de judeus perderam a vida. Aquele cheiro forte, um odor estranho, parece permanecer no ar para sempre.
As vítimas, segundo os documentários que são exibidos no memorial, chegavam por meio de trens de carga. Eram transportadas como gado. Muitos já estavam doentes. Todos morrendo de fome e de sede, sujos e aos trapos. Rápida triagem determinava a ida dos doentes diretamente para os fornos. Os demais, que poderiam ser úteis em algum trabalho futuro, eram levados para os pavilhões, os barracões de madeira com piso de terra batida.
Tudo ainda está bem conservado, mostrando com fidelidade como era o local em 1945, quando os nazistas fugiram das tropas aliadas, abandonando os prisioneiros que não tiveram tempo de matar.
Os visitantes de Dachau costumam caminhar em silêncio. Só se escutam os passos. Ou as breves frases dos guias. Todos observam as paredes escuras dessas construções e sempre têm a sensação de que já viram aqueles locais.
Na verdade, a visita é uma confirmação, uma dura confirmação do que cada um já viu em filme, em fotos ou leu em reportagens, nos livros ou na internet a respeito do ambiente terrível dos campos de concentração de Auschwitz, Birkenau, Brzezinka, Oswiesim, Sobibor e outros. Eles são mantidos como provas históricas do genocídio, para que ninguém esqueça o que ocorreu.
Primeiro campo de concentração alemão, Dachau foi ativado em 20 de março de 1933 por Heimich Himmler em uma antiga fábrica de pólvora, após Adolf Hitler tornar-se chanceler de Berlim. Estima-se que 206 mil prisioneiros de 30 países (um terço deles judeus) tenham ido para esse campo de concentração até o fim da IIª Grande Guerra, em 1945. Destes, pelo menos 32 mil morreram ali.
“Arbeit macht frei” (‘O trabalho liberta’, em alemão), era a frase da grande placa de ferro colocada no portão de entrada do campo de concentração. Enganados, os prisioneiros não sabiam que só a morte os libertaria. Dachau tornou-se modelo para todos os demais campos que seriam construídos depois. Era dividido em duas áreas: os 32 barracões (um deles utilizado para experiências médicas) e o setor dos fornos crematórios, câmaras de desinfecção, câmaras de gás, sala de enforcamentos e depósito das cinzas.
Nos pavilhões os esquálidos prisioneiros sofriam o pesadelo do dia-a-dia durante o período em que sobreviviam em Dachau, algo como três ou quatro meses. Quem não morria de fome ou de doença tinha como destino os fornos crematórios…ou era fuzilado e atirado nas gigantescas valas, já ao final da Guerra.
Poucos sobraram para contar essas tristes histórias que emocionaram a humanidade. Seus terríveis relatos, mais os documentos, fotos e filmes recuperados, são provas dessas horríveis fábricas de matar, responsáveis pelo assassinato de seis milhões de judeus na década de 40. O fim do martírio em Dachau só ocorreu em 29 de abril de 1945, com a chegada das tropas norte-americanas. Três meses antes, em 27 de janeiro, Auschwitz, na Polônia, foi o primeiro campo libertado, em ações dos soviéticos.