Estamos habituados a tomar conhecimento de episódios de corrupção e de lavagem de dinheiro.
É raro passar algum tempo sem que novos fatos aflorem para escandalizar a opinião pública, envolvendo servidores, vereadores, prefeitos, deputados estaduais e federais, governadores, senadores, até os mais altos mandatários da Nação.
Disse o padre Antônio Vieira, em carta de 4 de abril de 1654 ao Rei D. João IV, respondendo consulta sobre a conveniência “de haver neste estado, ou dois capitães-mores ou um só governador”, que “menos mal será haver um ladrão do que dois; e que mais dificultoso serão de achar dois homens de bem do que um” (Cartas, Coimbra,
Imprensa da Universidade, 1925, vol. I, pág. 416).
No célebre Retrato do Brasil, concluído em 1927, Paulo Prado apontou como grandes impulsos, para a colonização do Brasil, “a ambição do ouro e a sensualidade livre e infrene que, como culto, a Renascença fizera ressuscitar” (Companhia das Letras, SP, 1977, pág. 53).
Acompanho os fatos da política desde Capivari, onde nasci em 1936 e deixei em 1961 para advogar em São Paulo. Figura dominante da época era Adhemar de Barros (1901-1969), conhecido pelo bordão “rouba, mas faz”. São da época as expressões “negociata” e “caixinha de Ademar”. Seu principal oponente foi Jânio Quadros, “o
homem da vassoura”, como síntese de programa de combate à corrupção.
É impossível condensar em pequeno artigo os nomes dos corruptos que passaram pelos poderes Legislativo e Executivo apenas nos últimos 25 anos. Em 2005 tivemos o escândalo dos Correios, fotografado e filmado sigilosamente. Algum tempo depois, o episódio envolvendo o deputado Gedel Vieira Lima, em Salvador, capital da Bahia, cujo apartamento escondia milhões de Reais. Ou do assessor do deputado federal José Guimarães, preso no aeroporto de Congonhas com milhares de dólares escondidos na cueca. Relembrem-se as mega-operações Mensalão e Lava-Jato, e os sucessivos governadores do Rio de Janeiro acusados, processados, cassados e condenados por corrupção.
A relação dos corruptos é interminável. Alguns foram punidos. A maioria, não. De toda maneira, porém, seria necessário minuciosa pesquisa de alcance nacional, se quisermos conhecê-los. O Brasil é visto como país da impunidade. Os processos judiciais têm como característica dominante a morosidade. Em inútil tentativa de remediá-la a Emenda nº 45, de 31/12/2004, adicionou ao art. 5º da Constituição o inciso LXXVIII, com esta redação: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade da sua tramitação”. De nada valeu. É habitual juiz ou ministro, no curso do julgamento, pedir vista regimental dos autos, para só devolvê-los semanas ou meses depois. Quando o réu
está ciente da condenação, a lentidão se transforma em instrumento de defesa, impedindo a sentença até se beneficiar com a prescrição.
Nada, contudo, se equipa ao escândalo do INSS. Quadrilhas de refinados marginais, organizados em sindicatos,
federações, confederações e associações, se reuniram com ajuda interna, de políticos e de escritórios de advogados, para roubar aposentados e pensionistas, causando-lhes prejuízos da ordem de R$ 6,3 bilhões. Descontos passaram a ser feitos durante anos nas folhas de pagamento, sem autorização expressa de milhões de lesados.
Ouvindo depoimentos pela TV Senado, nada me causa tanta repulsa quanto o silêncio ou cínicas respostas dadas pelos inquiridos aos senadores que os interrogam. Fisionomias incapazes de ocultar o caráter e o estilo de vida, tentam esconder aquilo que comprovam maços de documentos sobre movimentações ilícitas de dinheiro, entre empresas de fachada e desvios em lavagens.
Recentemente a imprensa internacional noticiou o caso de ex-ministro do governo chinês fuzilado por corrupção. Sou desfavorável à prisão perpétua e à pena de morte. Não cheguemos a esses extremos. Por outro lado, a morosidade judicial tem permitido a prescrição, ou levado à absolvição criminosos da pior espécie.
No caso da fraude contra aposentados e pensionistas do INSS, exige-se do Ministério Público e do Poder Judiciário o cumprimento dos deveres constitucionais e legais sem morosidade, para impedir que chicanas utilizadas por maus advogados retardem o andamento do feito até fazê-lo cair no esquecimento e ser fulminado pela prescrição.
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*Advogado. Foi Ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior
do Trabalho.