A Lei de Lavagem exige um elemento subjetivo especial para configuração do crime. Não basta que o agente pratique qualquer conduta de ocultação ou dissimulação, sendo necessário que aja com o intuito de mascarar a origem ilícita do bem obtido para sua subsequente reinserção na economia com aparência de licitude. Por essa razão, condutas como a de esconder dinheiro embaixo do colchão ou guardá-lo em baú, por mais que representem modalidades de ocultação, não estão imbuídas do dolo específico inerente à configuração do crime de lavagem, constituindo mero exaurimento do delito anterior.
Não há uma nova ação destinada a limpar o dinheiro sujo ou a lhe conferir aparência de legalidade, mas simples disposição do bem ilicitamente incorporado ao patrimônio do agente. Nessa linha, o STJ já procedeu ao trancamento de ação penal sob o argumento de que “o crime de lavagem de capitais exige escondimento do dinheiro ilícito, por ocultação ou dissimulação. Necessário é que se possa com a manobra de lavagem distanciar, dissociar o dinheiro de sua origem”
Quando se pratica uma empreitada criminosa, da qual decorrerá um produto ou proveito econômico, é de se esperar que o agente venha a guardar ou dispor desses valores. Quem furta uma carteira com dinheiro pretende gastá-lo, quem aplica um estelionato persegue algum proveito econômico posterior. Em todos esses casos, a fruição do produto do crime antecedente não passa de uma destinação normal dada pelo agente, ou seja, mero exaurimento do crime anterior.
Distinção entre lavagem de dinheiro e exaurimento
Punir como lavagem de dinheiro tais condutas implicaria inaceitável bis in idem, já que o exaurimento está inserido no contexto do delito já cometido. É seu esgotamento natural. O bem jurídico tutelado pelo tipo penal da lavagem de dinheiro não se confunde com o do crime antecedente, podendo ser tanto a administração da justiça quanto a ordem econômica, a depender do caso. Quando o agente passa a agir como se fosse o legítimo possuidor dos valores, tal comportamento, por si só, não configura a lavagem de dinheiro, sendo necessário que atue para branquear o dinheiro sujo, de modo a produzir uma imagem de normalidade de seu patrimônio.
Assim, sua configuração exige a realização de uma nova conduta criminosa, distinta da prática delituosa anterior e dela destacada, por meio da qual o agente dificulta a ação da justiça, mediante expediente dissimulador ou por ocultação. Dispor simplesmente do produto do crime ou guardá-lo como se fosse seu, nada mais é do que lhe dar normal destinação, dentro da linha de desdobramento causal previsível e esperada.
É precisamente neste ponto que reside a diferença entre a lavagem de dinheiro e o exaurimento. Outrossim, nas hipóteses em que não há exaurimento, necessário distinguir-se a lavagem de dinheiro do favorecimento pessoal (artigo 349 do CP), cuja pena privativa de liberdade é bem menor, detenção de 6 meses a 1 ano, justamente porque aqui não há ação destinada à reinserção do produto do crime no mercado com aparência de normalidade [2].
O que configura, portanto, a lavagem de dinheiro não é a normal disposição do produto ou proveito obtido, mas o dolo de mascarar, disfarçar, maquiar, limpar a origem ilícita do produto do crime para lhe conferir aparência de capital lícito.
Nesse sentido, para o Supremo Tribunal Federal “a lavagem de dinheiro é entendida como a prática de conversão dos proveitos do delito em bens que não podem ser rastreados pela sua origem criminosa. A dissimulação ou ocultação da natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade dos proveitos criminosos desafia censura penal autônoma, para além daquele incidente sobre o delito antecedente”
Fonte: Conjur(Consultor Juridico)