As redes sociais são na atualidade um dos maiores veículos de divulgação de informações em quase todo o mundo. Digo isso porque, em alguns países, elas são censuradas e só se veicula o que o governo entender pertinente. Isso para que seja mantido o status quo.
Ocorre que é de conhecimento comum que nem todos são iguais perante a lei para elas. Alguns, podem publicar e veicular as informações que quiserem sem que sejam censurados, ao passo que outros, a depender de sua ideologia, conservadora ou progressista, muitas informações não podem ser sequer publicadas.
Isso sem nenhum amparo legal.
É certo que assinamos com as redes sociais e serviços de mensagerias privadas um contrato de adesão, com diversas cláusulas leoninas.
E, entre essas cláusulas, existe a possibilidade de censura prévia do que os administradores entenderem que ferem as regras de publicação.
Uma empresa privada estrangeira, que não detém o monopólio da informação, não pode censurar de acordo com suas próprias convicções do que se pode publicar ou não. Isso porque seu funcionamento depende de autorização do país onde atua e, por isso, deve obediência às nossas regras constitucionais e legais, notadamente quanto à liberdade de expressão e isonomia, direitos fundamentais de toda pessoa.
Muitas vezes, para não ser explicita a censura, as publicações simplesmente não são entregues para outros usuários ou o são em pequeníssima quantidade, em processo que recebe o nome de “banimento fantasma” (“shadowban”), costumeiramente empregado pelas redes sociais. Tal conduta equivale à própria censura, posto que, em universo de milhares de usuários que compartilham das mesmas ideias, poucos são atingidos pelas publicações.
Não violando a publicação nenhuma norma legal ou a moralidade média e nem sendo objetivamente prejudicial a qualquer pessoa, não cabe à rede social e serviços de mensagerias privadas aplicar a censura, expressamente vedada pela nossa Magna Carta.
Outra forma de censura dissimulada é a desmonetização de canais notadamente no Youtube, sob o pretexto de divulgarem notícias falsas ou incentivarem atos antidemocráticos.
Esses canais difundem notícias e comentários gerais de acordo com a visão do comunicador, que pode, ou não, ser jornalista de profissão, mas são comunicadores e protegidos pela liberdade de expressão.
Praticado algum delito, que se instaure uma investigação ou ação penal, observado o devido processo legal, contraditório e ampla defesa; no entanto, censura prévia, é proibida pela Constituição Federal para os comunicadores em geral, que no seu artigo 220, § 2º, diz:
“Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.
(…)
§ 2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística”.
Em igual sentido, voltado para todas as pessoas e não só aos comunicadores, reza o artigo 5º, inciso XI, da Magna Carta:
“IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;”
Com efeito, não é possível censurar previamente canais que veiculam notícias e comentários. E pior, sem que tenha sido instaurado processo competente (ação judicial), mediante requerimento de algum legitimado, e, ainda, sem que tenha sido dada oportunidade de defesa para os atingidos.E tudo isso de acordo com o entendimento e ideologia dos proprietários dessas empresas, muitas vezes por meio de verificadores independentes, que sequer são agentes públicos e agem de acordo com seu subjetivismo do que é certo ou errado.
Isso sem contar que podem existir interesses outros nada democráticos por detrás da desmonetização de canais, que não tardarão a alcançar grandes veículos de comunicação, por estarem a contrariar interesses de pessoas e empresas poderosas
Dispõe o artigo 9º da Lei nº 12965/2014 (Marco Civil da Internet), que estabelece os princípios, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil, que: “O responsável pela transmissão, comutação ou roteamento tem o dever de tratar de forma isonômica quaisquer pacotes de dados, sem distinção por conteúdo, origem e destino, serviço, terminal ou aplicação”.
Um dos princípios basilares da Internet, não só no Brasil, mas nos países democráticos do planeta, é a neutralidade da Rede. Todos devem ser tratados de forma igualitária, atendendo, aliás, mandamento constitucional de que todos são iguais perante a lei (princípio da isonomia).
É verdade que o dispositivo não trata especificamente de redes sociais e nem de serviços de mensagerias privadas, mas de provedores de acesso à Internet. Contudo, esse princípio é basilar e deve alcançar todo tráfego de dados pela Rede.
Com efeito, não é possível a qualquer rede social ou serviços de mensagerias privadas, como o WhatsApp, tratar de maneira diferenciada quem é conservador ou progressista, o que, atualmente, tem ocorrido.
É comum, aliás, como já afirmado, mascarar a censura por meio da redução do alcance das publicações (“shadowban”), de modo a praticamente zerar o número de visualizações, método atualmente muito empregado pelas redes sociais. Basta veicular algo que não esteja de acordo com sua ideologia ou entendimento, ou ser proveniente de alguma mídia, jornal ou revista, que seja contrária ao que repute o certo, de acordo com o entendimento de seus proprietários, diretores ou acionistas majoritários, que alcançará um número bem reduzido de pessoas.
Não comungo e nunca defenderei nenhum tipo de incitação à violência ou à prática deatos ilícitos contra nossas Instituições ou pessoas. Porém, o que vale para um, deve valer para todos. Por que, então, não se retiram da Rede mensagens de extremistas de esquerda, ditadores e líderes religiosos que pregam violência contra pessoas de determinada ideologia, religião, nacionalidade ou país? Basta uma pequena pesquisa na Rede para se constatar que isso existe e continuam a ser divulgados e propalados discursos de ódio, sem que absolutamente nada ocorra para aqueles que assim agem, sendo mantidas suas contas abertas e mensagens ativas. Por outro lado, se fosse alguém conservador, de direita, de país cuja doutrinação ideológica interessasse aos administradores, podem ter certeza de que as publicações seriam impedidas e até mesmo a conta bloqueada ou encerrada.
Há em tramitação no Congresso Nacional e foi aprovado no Senado Federal, encontrando-se na Câmara dos Deputados, projeto de lei que visa regulamentar as redes sociais e serviços de mensagerias privadas.
No entanto, referido projeto, em sua redação inicial, traz normas preocupantes e que poderão instituir a censura na Rede. E pior, ficará nas mãos de verificadores independentes, que são escolhidos a dedo pelos administradores.
O artigo 12 do PL 2630/2020, mais conhecido como PL das Fake News, traz regra que permite à rede social retirar do ar, sem ouvir o autor, perfis e publicações que reputem, de acordo com seu subjetivismo, causarem risco, dentre outras hipóteses, de dano imediato de difícil reparação; para a segurança de informação ou do usuário; de grave comprometimento da usabilidade, integridade ou estabilidade da aplicação.
Só após a retirada do ar do perfil ou da publicação é que o prejudicado poderá recorrer da decisão liminar da rede social, isso mesmo, da rede social e não de um juiz de direito.
Será possível pleitear indenização da rede social se ela tiver se equivocado. De acordo com nossos padrões, as indenizações são irrisórias diante do dano que pode ser causado pela rede social ou serviço de mensageria privada.
Cuida-se de fórmulas genéricas, extremamente abertas, que podem ser interpretadas ao gosto do freguês.
Caso seja aprovado, estar-se-á sendo instaurado de direito, uma vez que de fato já existe, o domínio da informação pelas redes sociais e mensagerias privadas, com a possibilidade de publicação e divulgação do que quiserem.
Anoto que o Marco Civil da Internet (Lei nº 12965/2014) não autoriza a retirada do ar de perfis, o que equivaleria à censura prévia, vedada constitucionalmente, mas apenas publicações mediante ordem judicial devidamente fundamentada (art. 19).
O domínio da informação possibilita doutrinar as pessoas, notadamente as mais jovens, inexperientes, ingênuas e incultas, de acordo com a ideologia do detentor dos meios de comunicação social. Com isso, a massa de manobra será levada para onde quiserem.
Tal proceder pode ser determinante para o resultado de eleições ou até mesmo para a governabilidade de um país. Não preciso falar mais porque até o mais ingênuo irá entender o que estou a dizer.
Tempos sombrios em que a maioria das pessoas sequer percebe que está sendo doutrinada e alienada para determinado caminho, o que não ocorreria se informações contrárias não lhes fossem sonegadas.
Um país sem liberdade de comunicação e de manifestação do pensamento não pode ser considerado democrático. Democracia pressupõe liberdade de contrariar e de criticar a tudo e a todos. Não pode existir assunto proibido ou que seja tabu. Ninguém e nem mesmo Instituições estão imunes a críticas e contrariedades que não ultrapassem a proporcionalidade, que sempre deve existir de modo a não ser ferido direito fundamental de outrem, como a honra, tranquilidade, paz de espírito e segurança.