Em praticamente todas as entrevistas me fazem uma pergunta recorrente: quem é o melhor orador da política hoje no Brasil? Como já estou nessa estrada como professor de oratória há quase 50 anos, os eleitos foram mudando de época para época. Alguns saem do pódio e voltam depois de algum tempo. Outros se retiram para nunca mais voltar.
Embora a minha opinião seja baseada em aspectos técnicos da comunicação, não há como negar que em questão de gosto há preferências subjetivas que nem mesmo o analista consegue identificar. Uns encantam pela voz. Outros pelo conteúdo. Outros pela linguagem correta e fluente. Alguns poucos, entretanto, magnetizam as plateias pelo conjunto da obra. É sobre esses que vou falar.
Para não voltar tanto no tempo, mas tendo a consciência de que para certas pessoas, especialmente os mais jovens, esses anos de retorno ao passado se assemelham a uma eternidade, vamos começar por uma das vozes mais contundentes da história, Carlos Lacerda. Nasceu no Rio de Janeiro em 1914 e faleceu na mesma cidade em 1977.
Foi vereador em 1947, deputado federal de 1955 a 1960 e governador do estado da Guanabara entre 60 e 65. Deixou marcas importantes como, por exemplo, ter fundado o jornal Tribuna Impressa e criado a editora Nova Fronteira. Sua oratória não encontrava rival. Os adversários temiam enfrentá-lo nas tribunas. Além de ser muito bem-preparado e eloquente, falava com terrível ferocidade.
Ainda no tempo das fitas cassetes, eu levava comigo no carro dezenas de gravações com seus discursos e debates. Ouvia atentamente cada passagem de seus pronunciamentos com o objetivo de analisar as técnicas que punha em prática para conquistar vitórias e fazer prevalecer suas teses. Nunca hesitava. Com vocabulário fluente, pronto e de excelente qualidade, encontrava as palavras sempre com muita facilidade.
Era possível descobrir em cada discurso uma nova estratégia camuflada nas entonações e nas entrelinhas. Nem sempre era apenas o argumento preciso e irrefutável, nem a composição harmoniosa de suas frases; em diversas circunstâncias impressionava mais as pausas prolongadas e expressivas. Foi, sem dúvida, um orador exemplar.
Outro político que envolvia os ouvintes com sua oratória foi Juscelino Kubistchek, o fundador de Brasília. Não era agressivo. Não era eloquente pela força da voz. A beleza da sua comunicação estava na elegância da sua postura, na harmonia dos seus gestos e na leveza do seu discurso. Podia falar por tempo prolongado sem cansar ou aborrecer o público. Ouvi-lo era um enorme prazer.
Depois surgiu Jânio Quadros. Talvez o mais habilidoso – e controverso – de todos os oradores que perambularam pela política. Sabia como se identificar com o público em todas as circunstâncias. Culto, inteligente, dotado de um vocabulário incomparável. Encontrava as palavras adequadas para falar com pessoas de elevado nível intelectual, e substituía sem esforço os vocábulos para magnetizar as multidões nos comícios da Vila Maria, bairro popular de São Paulo.
Quando ministrei aulas para o ex-ministro João Mellão Neto, que fora seu secretário de administração na prefeitura, perguntei se não era difícil conviver com alguém de personalidade tão temperamental. Ele me respondeu que Jânio foi a pessoa mais inteligente, sensata e lúcida que conhecera em toda a vida.
Ao despachar com ele no dia a dia, as decisões eram claras, diretas e objetivas. Ao pôr em prática o que haviam decidido, entretanto, o panorama se transformava. Disse que o prefeito pendurava chuteira na porta, para responder àqueles que falavam em sua saída do poder. Vestia camisa do Corinthians, seu time do coração. Invertia os pés dos calçados. Com esses artifícios conseguia o que desejava, ir para as primeiras páginas dos jornais.
Mais próximo de nós, tivemos outro político com oratória extraordinária, Roberto Jefferson. Esse conheci muito bem porque foi meu aluno. Da mesma forma que Lacerda, o então presidente do PTB era invencível nos debates. Dotado de memória impressionante, lembrava de detalhes que atormentavam os adversários.
Mesmo possuindo voz forte e determinada, teve o cuidado de aprimorar ainda mais esse recurso marcante da sua comunicação, frequentando aulas de canto. Suas entrevistas nas emissoras de rádio e televisão eram reprisadas à exaustão, sempre com audiências recordes. Tratava de assuntos elevados e não temia quem quer que ousasse enfrentá-lo. Todos se lembram das contendas que protagonizou com o todo poderoso José Dirceu. O fato ficou para a história.
Com a saída de Jefferson da trincheira combativa, brilha agora sem concorrência Ciro Gomes. Não há no país hoje um político que tenha qualidade oratória que se aproxime da sua eloquência. Sua voz grave, bem-timbrada, bonita nunca enrouquece. Por mais que brade em suas perorações. Tem consciência dos momentos em que a mensagem precisa de um tempo de reflexão e, para isso, faz pausas adequadas, expressivas.
Ciro trata com propriedade qualquer tema. Com sua vasta experiência, tendo ocupado praticamente todos os cargos importantes na política nacional, rebate aos ataques que recebe com a serenidade de quem tem certeza dos argumentos que usa. Sua fala é inconfundível. É possível identificar sua presença ainda que muitos oradores estejam discutindo ao mesmo tempo.
A pergunta que fica é esta: se ele é tão bom orador assim, por que não consegue se eleger como presidente? Bem, numa campanha presidencial muitos fatores precisam ser levados em conta. A ideologia política tem grande influência no voto dos eleitores. Algumas das ideias que defende não encontram eco em boa parte da população. E, talvez, o mais grave de seus problemas, possui um pavio muito curto.
Em todas as campanhas ele começa de maneira amena, contido, sereno. Em determinado momento, entretanto, por vaidade ou por ter o sangue à flor da pele, se torna agressivo de forma tão desproporcional que assusta boa parte dos eleitores. Não é um defeito fácil de ser contornado. Os concorrentes sabem desse ponto vulnerável e não perdem oportunidade para atacá-lo por esse flanco.
Essa já é outra história. Por enquanto, vamos nos ater apenas à sua invejável habilidade oratória. É sem dúvida um orador que ficará para sempre na história dos grandes tribunos brasileiros.
Reinaldo Polito é Mestre em Ciências da Comunicação e professor de Oratória nos cursos de pós-graduação em Marketing Político, Gestão de Marketing e Comunicação, Gestão Corporativa e MBA em Gestão de Marketing e Comunicação na ECA-USP. Escreveu 35 livros, com mais de 1,5 milhão de exemplares vendidos em 39 países. Siga no Instagram: @polito pelo facebook.com/reinaldopolito pergunte no https://reinaldopolito.com.br/home/
Quem é o melhor orador na política brasileira hoje? Por Reinaldo Polito – ORBIS NEWS
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