O orçamento de publicidade do governo federal em 2025, referente à divulgação das ações dos ministérios, subiu mais de 70% na comparação com o orçamento de 2022, último ano de Bolsonaro na presidência. Teve uma disparada para R$ 876 milhões, superando o orçamento para campanhas de utilidade pública. Dados estão disponíveis no Portal da Transparência, da Controladoria-Geral da União (CGU), e exclui os gastos com propaganda nas estatais.
Segundo projeção publicada pela Folha de S. Paulo em março deste ano, os investimentos públicos em comunicação do governo federal para 2025 podem alcançar R$ 3,5 bilhões, com destaque para Banco do Brasil, Secom, Caixa Econômica Federal, Correios, Ministério da Saúde e Petrobrás. Com exceção do Ministério da Saúde, todas essas instituições devem superar os valores investidos em 2022.
No caso dos Correios, que não registraram gastos na área naquele ano, a previsão para 2025 é de um aporte expressivo de R$ 380 milhões.
Portanto, os contratos de publicidade dos ministérios, bancos e estatais no governo Lula 3 devem atingir o pico da montanha, em uma tentativa de frear ciclos persistentes de queda de popularidade. Foi a maior expansão de recursos para comunicação governamental nos últimos 10 anos. o auditor João Paulo Silveira, em artigo recente publicado no Globo, lembra o que deveria nortear a comunicação governamental: “informar e orientar o cidadão, não elogiar mandatos”. E destaca o populismo e a redundância do novo slogan do atual mandato de Lula – “Governo do Brasil – do lado do povo brasileiro”. Ora, diz ele, “todo governo deveria estar ao lado do povo”.
Os desvios nas estratégias de comunicação governamental não são novos. Num breve retrospecto histórico, é possível observar que esta começa a se confundir com o marketing político, de forma sistemática e massiva, nos anos 1930, no início do primeiro governo de Getúlio Vargas. Ele inovou com a criação da “Hora do Brasil”, programa governamental obrigatório no rádio, e depois lançando o Departamento Oficial de Propaganda (DIP). Essa estrutura foi radicalizada após o golpe em que Getúlio instituiu o Estado Novo, em 1937, fechando o Congresso Nacional, extinguindo os partidos e centralizando todo poder no Executivo.
Inspirado na comunicação nazista de Goebbels, na Alemanha, e na experiência fascista de Mussolini, na Itália, Vargas direcionou a comunicação para a exaltação do regime e a construção de sua imagem como líder popular. O DIP passou a moldá-lo como um estadista magnânimo e “pai dos pobres”. Os estados da federação reproduziram o modelo, criando departamentos subordinados ao DIP. Todo esse mecanismo perdurou até que Getúlio fosse deposto em 1945 por uma junta militar, que convocou eleições, elegeu o marechal Eurico Gaspar Dutra e deu posse ao novo presidente em janeiro de 1946.
Um novo período de comunicação governamental autoritária veio, porém, com outro golpe militar, o de 1964. O regime instaurou longo período de cerceamento aos partidos, ao Congresso, à mídia e aos direitos políticos e civis – este ciclo da ditadura militar foi pleno de medo. A censura se abateu sobre os meios de comunicação, até que a morte do jornalista Vladimir Herzog, em um cárcere do DOI-CODI, em outubro de 1975, criou profundo fosso entre a sociedade e os militares.
O trauma abriu as portas de uma lenta distensão do regime, encerrado em 1984, depois que o Congresso Nacional aprovou a volta do poder aos civis, por meio de eleição indireta.
José Sarney, político maranhense oriundo da Arena, partido que sustentara a ditadura, assumiu a presidência como vice do oposicionista Tancredo Neves, eleito, mas falecido antes da posse, e foi o responsável por inaugurar a Sexta República Brasileira, em um contexto de ampla restauração das liberdades públicas. O governo foi conturbado, marcado por inúmeras denúncias e disputas acirradas no campo das ideias e dos direitos, além de profunda crise econômica, mas conseguiu legar uma nova constituição ao país. Esta inseriu a liberdade de expressão e informação como um dos direitos e garantias fundamentais dos cidadãos (Art. 5º), delimitou o caráter da propaganda governamental (Art. 37) e gerou um corpo de diretrizes para a comunicação social (Artigos 220 a 224), incluindo princípios de radiodifusão.
A comunicação governamental tornou-se mais estruturada nos governos civis da Sexta República, com a elaboração de planos estratégicos associados às bandeiras programáticas de cada governante. No entanto, manteve traços de um discurso populista e propagandístico típico de práticas do marketing político, consolidando-se como um instrumento essencial para o êxito das campanhas eleitorais desses governantes.
Um dos exemplos mais emblemáticos foi a vitória de Fernando Collor de Melo, eleito em 1989 no primeiro pleito direto de um presidente civil desde a ditadura. Sua campanha nacionalizou a figura do “caçador de marajás”, imagem construída durante seu governo em Alagoas.
O Art. 37 da Constituição Federal é claro ao estabelecer que a finalidade da comunicação social do Estado deve seguir em direção oposta a essa prática, mantendo caráter educativo, informativo e/ou de orientação social, assim como os princípios da impessoalidade e da transparência. Esse propósito se manifesta, por exemplo, em iniciativas como o Portal da Transparência e em campanhas de utilidade pública, que são exceção, não regra.
Entra e sai governo, o viés personalista exibe força na maior parte das propagandas, dissimulado sob as “marcas” dos principais programas governamentais, tendência sobre a qual Lula parece apostar cada vez mais, motivado pela disputa presidencial de 2026. Para sua reeleição, parece valer tudo, inspirado na lição de Maquiavel: “o fim justifica os meios”.










