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Bolsonaro e a tentativa de rompimento da tornozeleira – por Cesar Dario

O vídeo em que o ex-presidente Jair Bolsonaro admite ter queimado a tornozeleira eletrônica chocou o Brasil. Não propriamente pelo ato em si, mas pela forma como respondeu à indagação sobre se teria queimado o aparelho.

Não sou psicólogo, mas, pela minha experiência de décadas lidando tanto com pessoas comuns quanto com indivíduos que enfrentam transtornos mentais, o que se percebe ali é alguém psicologicamente abatido por tudo o que vem enfrentando, situação essa que sequer precisa ser comentada, por ser de conhecimento público.

O vídeo, entretanto, suscita diversas indagações, sobretudo porque se trata de uma pessoa inteligente, experiente e que alcançou o mais alto cargo público de uma nação.

Uma delas consiste em entender por que teria agido daquela forma e justamente naquele momento, tarde da noite e sem qualquer possibilidade real de fuga.

Sem adentrar profundamente o mérito da questão, sob uma ótica humana e, também, com um viés técnico/jurídico, procurarei esmiuçar o tema de maneira objetiva.

Com tantas formas conhecidas de romper uma tornozeleira eletrônica, causa estranheza tentar fazê-lo com um ferro de solda e ainda no módulo de monitoramento, e não no bracelete que prende o equipamento ao tornozelo.

Mais estranho ainda é imaginar que Bolsonaro desconhecesse que qualquer tentativa de violação aciona imediatamente a central de monitoramento, que, por sua vez, comunica prontamente os policiais responsáveis pela vigilância no local, o que, de fato, ocorreu.

Se isso é uma tentativa de fuga é a mais bizarra que já vi.

Também não parece razoável imaginar que a fuga ocorreria durante uma vigília religiosa marcada para cerca de 19 horas depois da danificação do aparelho. Não seria mais lógico e sensato deixar para romper a tornozeleira durante a vigília?

Além do que, com a expressiva presença policial destacada para a vigilância de Bolsonaro, que se encontra com a saúde extremamente debilitada, uma fuga seria impossível.

Tudo indica muito mais um surto psicológico de alguém que sabe ser inocente e teme passar o resto da vida na prisão sem ter cometido nenhum crime, do que propriamente uma tentativa de evasão, a qual, se realmente desejasse, poderia ter articulado quando ainda estava em liberdade, como fizeram os Deputados Federais Alexandre Ramagem e Carla Zambelli.

Lembro, ademais, que o direito de reunião é constitucionalmente assegurado, e que a vigília constitui a mais pura expressão da religiosidade, igualmente alçada à condição de direito fundamental.

Ainda que se considerasse o ato ilegal, que não é o caso, como já demonstrado, ninguém pode ser punido processual e penalmente por fato de terceiro, observado o princípio constitucional da personalidade da pena, visto que a vigília foi idealizada e organizada por seu filho, o senador Flávio Bolsonaro.

No mais, está nas mãos de Deus, que tudo vê e nada deixa passar, seja em relação aos que praticam o bem, seja em relação aos que praticam o mal.

Autor: César Dario Mariano da Silva – Procurador de Justiça – MPSP. Mestre em Direito das Relações Sociais – PUC/SP. Especialista em Direito Penal – ESMP/SP. Professor e palestrante. Autor de diversas obras jurídicas, dentre elas: Comentários à Lei de Execução Penal, Manual de Direito Penal, Lei de Drogas Comentada, Estatuto do Desarmamento, Provas Ilícitas e Tutela Penal da Intimidade, publicados pela Editora Juruá.

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