Já é possível programar dia, hora e local para o nascimento de uma nova vida humana graças à ciência, mas com a morte a equação é um pouco diferente. Além da morte natural, própria da finitude da vida, há que se levar em conta outras. São as relacionadas a acidentes, incidentes, assim como decisões judiciais em países onde ainda persistem a pena capital, morte assistida (autorizada legalmente), a eutanásia, ou então o suicídio. Este último degrau da morte merece estudos e muito conhecimento para analisar suas raízes. A verdade é uma só e até agora imutável: independente da forma, a morte é certa. Há dias essa imutabilidade levou o jornalista José Nello Marques. Ele era uma figura ímpar. Começou a trabalhar aos 14 anos, lá pelos idos dos anos de 1970, na Rádio Clube de Garça, cidade paulista onde nasceu. Ainda meninão se transferiu para a Rádio Verinha de Marília, que também serviu de escada para nomes consagrados como os de Osmar Santos e Oswaldo Maciel. Sua voz e seu talento ultrapassaram os limites do interior e ao chegar a São Paulo, o mundo se abriu, definitivamente. Nem vale aqui tantas linhas para descrever por onde passou, emprestando seu talento porque está na sua biografia. As melhores emissoras de rádio e de televisão o receberam para apresentar, animar e até “levantar audiência”. Pudera, era um profissional tão competente e completo que tinha a capacidade de transmitir uma missa e fazer o ouvinte chorar, assim como era dele, também, a capacidade de fazer do rádio um veículo de humor e distração para provocar alegrias e sorrisos. O nome de José Nello Marques representava um “selo de qualidade” para as empresas de comunicação onde trabalhou. Embora com toda sua bagagem intuitiva não deixou por menos. Cursou jornalismo. Na mesma faculdade onde foi aluno, também foi professor, mas não ficou só nisso. Ministrou seu ofício em outras escolas e palestrou para muitos jovens. Foi além: escreveu o livro “Perguntar Ofende!” Nesse livro de 120 páginas, ora com humor, ora com sarcasmo, registrou algumas perguntas que repórteres fazem diante de diferentes circunstancias. Uma delas, só a título de enfatizar sua verve, Zé Nello relata uma pergunta “cabeluda” de um repórter, que ao entrevistar o único sobrevivente de um acidente onde sua família havia morrido, lasca esta: “Como o senhor se sente diante desse acidente?”. Ou, então, aquela praxe de cobertura de eventos populares onde até hoje ouve-se o profissional de imprensa terminar uma entrevista dizendo “não tem hora para acabar…” O livro é rico de informações e “dicas”. Quem pensa em trabalhar na imprensa, apesar das mudanças que estão ocorrendo nestes tempos tão estranhos deve ler esse livro. Aliás, ler quase se transformou em palavrão já que os smartphones e outros meios digitais limitam textos em poucas linhas, quase sempre inconclusivas. Pobre do consumidor de informação. Zé Nello era esse cara especial. Sabia tudo, adorava uma boa prosa e comer bem – tinha que carregar seu corpo de cerca de 1,80 metro e uma massa corporal superando os 100 quilos. Em algumas oportunidades nossas famílias se reuniam em restaurantes para comer macarrão, o forte da gastronomia italiana. Pois, ele morreu e não encontrei uma ocasião adequada para lhe fazer uma pergunta que sempre me incomodou. Talvez a resposta fosse boba, e facilmente justificável. O fato é que essa pergunta não foi feita em vida. Mas vou transcrevê-la aqui, me dirigindo a ele e já me antecipando com pedido de desculpas aos que agem como ele agia: “Ô Zé, por que você usa faca e garfo para comer macarronada, ‘estripando’ o espaguetti?”
De origem italiana, desde criança aprendi que macarronada, especialmente em se tratando do espaguetti, se come enrolando seus fios em torno do garfo e não usando a faca. De qualquer forma, nossos encontros sociais e de comilança jamais serão esquecidos.
REFLEXÕES SOBRE VIDA, MORTE E ESPAGUETTI por Antoninho Rossini
Jornalista e Escritor
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